Como sua rotina de trabalho foi alterada pela pandemia de covid-19?
A rotina tornou-se extremamente complexa. A princípio, dúvidas e medo em relação à atuação profissional, assepsias e organização do trabalho voltado para o contexto. Considero que as visitas domiciliares foram a parte mais afetada: realizá-las sem proximidade, e sem acesso ao interior dos domicílios, é um distanciamento de vínculo. Entendo perfeitamente a necessidade dessa ação, porém é um momento em que o ser humano carece de estreitamento nas relações.
Que dificuldades são vivenciadas atualmente, pelos agentes de saúde, no contexto da pandemia?
No início, quando houve a confirmação de transmissão comunitária no estado, as dificuldades eram de acesso às informações com rapidez, sobre contágio, prevenção e promoção à saúde. Hoje, não naturalizamos a realidade da covid, mas entendemos e compreendemos que somente as ações de prevenção, principalmente ligadas à higiene, não darão conta da realidade. Convivemos com dificuldades estruturais, por conta do acesso aos serviços de saúde que no momento estão colapsados; administrativos, pela dificuldade de informações e orientações específicas para a metodologia do trabalho na ponta, na atenção primária, que não tem chegado em tempo hábil; e emocional, pois esse contexto tem exigido um comportamento individual. Na prática, a inexistência desse comportamento nos afeta. Um exemplo típico é que as pessoas querem se aproximar sem máscara e têm dificuldade em adotar as orientações de higienização. Sem falar no social, que precisa ser pensado, pois faz parte de um contexto que está diretamente ligado ao serviço do agente comunitário, pois temos acesso a trabalhadores autônomos que estão sobrevivendo em meio a tudo isso.
E o que tem ajudado nesse momento?
Como trabalhadores promotores de saúde populacional, vivenciamos a dificuldade diária da população. Admito que essa compreensão que estou desenvolvendo não tem sido fácil. Por isso tenho apoiado minhas considerações no que tenho aprendido no Curso Técnico de Agente Comunitário de Saúde (CTACS) oferecido pela EPSJV/Fiocruz. O cuidar precisa ser consciente com ações produtivas que farão sentido na vida de quem o recebe. Tenho refletido sobre e me esforçado para colocar em prática essas ações em minha atuação.
O que passa pela sua cabeça, entre angústias, estresse, preocupações e dificuldades para as próximas semanas ou meses?
Uma mistura de sentimentos me assola. Existem dias que me sinto angustiada pela situação do próximo, seja pela perda de um familiar, internação, falta de alimentos ou do elementar às vezes. São muitos relatos que chegam até mim. Em outros momentos, é possível estar feliz, realizada por ações profissionais e até pessoais, sejam de ajuda física ou psicológica. Tento não pensar muito no que está por vir. Isso gera ansiedade e pode acometer minha saúde emocional. Mas expectativas existem. Do lado negativo, o sistema de saúde parece estar na UTI. Na verdade, essa pandemia apenas revelou de forma clara a grave situação da saúde pública no Brasil tanto em nível estrutural como administrativo, o que de certa forma estava camuflado. E me pergunto como será se mais pessoas adoecerem. Vamos nos prevenir. Oriento e envio mensagens, em rede social, como uma forma de contribuição. Eis o medo de perder mais alguém. Do lado positivo, tudo vai passar, precisamos avançar, é necessário ajudar uns aos outros da forma que puder nos manter vivos e com a mente sã. Esse tem sido o meu lema.