Sempre que o país atravessa uma crise como a atual, as primeiras medidas implementadas são cortes na Educação — que já atinge R$ 6,1bilhão — e em Ciência e Tecnologia (C&T), que possui um dos menores orçamentos. Com isso, projetos de avanço e competividade são ignorados.
Enquanto outros países enxergam o investimento nestas áreas como forma de sair da crise, aqui se entende que Educação, Ciência e Tecnologia são gastos e não investimentos. A consequência disto virá no futuro, sob forma de risco à soberania, com dependência de importações de produtos industrializados de ponta, perdas na capacidade de inovação, baixo crescimento, além de êxodo de capital humano qualificado. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sinaliza ainda que o Brasil irá perder espaço no mercado internacional, em decorrência da perda de competitividade.
Aliado a isto, o cenário de desmonte de políticas públicas e desfinanciamento, que permanecem na pauta da agenda política neoliberal do governo brasileiro — que opta por transferir recursos do fundo público ao capital financeiro, como fundos de pensão, rentistas, desonerações fiscais e o pagamento da chamada dívida pública —, provoca o triste cenário de sacrifícios sociais, patrimoniais, morais e econômicos para a maioria da população brasileira, em especial os mais pobres, já que o que sobra não dá conta de atender suas necessidades básicas com saúde, educação, moradia e saneamento.
Nossas universidades públicas se inserem neste cenário de graves cortes, que inviabilizam até mesmo a manutenção de seus espaços — com gastos com limpeza, luz, abastecimento de água, conservação — um “triste quadro de desmonte e estrangulamento de nossas universidades”, conforme definiu em entrevista à Radis o ex-reitor da Universidade Federal da Bahia, Naomar de A. Filho.
Para além dos cortes que comprometem o atendimento e as necessidades básicas das universidades públicas, estão os cortes nas bolsas de estudantes, que segundo Naomar, serão responsáveis por “matar o futuro”. Sem bolsa, pesquisadores abandonam seus projetos ou saem do país, o que gera descontinuidade na formação de novas gerações de profissionais de elevada qualificação. Um verdadeiro retrocesso, que comprometerá o avanço do Brasil pelos próximos 20 anos.
A velha ideia de que a universidade pública é um elefante paquidérmico, burocrático lento e caro, que promove balbúrdias, parece ter retornado ao imaginário dos que governam nosso país. Ao contrário do que os defensores do neoliberalismo propagam, são as universidades que mais produzem trabalhos científicos, o que permite ao Brasil estar em 14º lugar no mundo neste item.
O futuro das universidades públicas, no modelo que existem hoje, erguidas com o tripé ensino, pesquisa e extensão, vai exigir um movimento de reafirmação do compromisso social, não para uma elite, mas para o povo, como defende Naomar. Como parte da sociedade, sua produção precisará chegar até o povo, para juntos intervirem no cenário político recessivo, acentuado pelas reformas já implementadas, como a da PEC 95. Em tempos de negação da importância de políticas públicas e banalização do autoritarismo, é preciso ficar atento ao programa “Future-se”, proposto pelo governo e que se encontra em consulta pública, já que pode significar o primeiro passo para a privatização das universidades e Institutos Federais. Este programa prevê a contratação de Organizações Sociais (OS), com finalidade de reduzir o tamanho do Estado e a transferência de algumas atividades para o terceiro setor.
Os projetos de extensão, um dos pilares das universidades públicas, são outra forma de sair dos muros dos conhecimentos tradicionais para “articular conhecimento e formação profissional com as demandas que a sociedade coloca”, conforme define a professora da Faculdade de Serviço Social, Ana Lívia Coimbra. Uma forma de troca de saberes inspirado nos ensinamentos de Paulo Freire, e que continua estimulando muitos jovens em várias cidades, conforme relatos capturados pelo jornalista Luiz Felipe Stevanim.
Também nesta edição são enfocados os riscos da resistência de microrganismos aos antibióticos, que chamam a atenção para os altos índices de mortes relacionados a eles. Para um país que aposta no agronegócio, seus efeitos sobre a produção de alimentos e na pecuária são preocupantes. Mas, conforme sinaliza a microbiologista da Fiocruz, Ana Paula Carvalho, existe uma forma de prevenir e controlar a proliferação desta resistência: Investir em saneamento e lavar sempre as mãos.