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O que é ser homem “de verdade”? Mulheres vêm, há muito, se repensando e problematizando seu lugar no mundo, buscando ou acompanhando transformações que as acolham como sujeitos diversos. A maioria dos homens, não. Em parte, pela confortável prerrogativa de poder numa cultura predominantemente patriarcal e machista, em parte, por não se darem conta do desconforto de seguirem padrões hegemônicos de masculinidade que lhes privam de reconhecer fragilidades, cuidar da saúde, expressar sentimentos e emoções, se entregar a contato físico, afetos e amor, assumir papel cuidador e amoroso na paternidade.

O repórter Luiz Felipe Stevanim ouviu especialistas e integrantes de grupos de discussão da condição masculina. O padrão de homem forte, provedor, ativo, distante emocionalmente de si e dos outros tende a ser irreal, inalcançável ou “tóxico” — um dos conceitos debatidos na reportagem. Acreditar em uma única forma de ser leva à rejeição de qualquer diferença na própria existência, ou nas múltiplas formas de ser masculino ou feminino, gera frustrações que reforçam características como o comportamento de risco, a agressividade e a violência. A ilusão da armadura de proteção resulta no oposto, a vulnerabilidade masculina. Segundo o Instituto Papo de Homem e a ONU Mulheres, um em cada quatro homens (até 24 anos) se sentem solitários sempre e os homens se suicidam quatro vezes mais. Os homens são as vítimas de 83% das mortes por homicídios e acidentes no Brasil. Refletir, portanto, é uma forma de resistir.

A ilusão da armadura de proteção resulta no oposto, a vulnerabilidade masculina

Desertificação, degradação de terras e secas que afetam cerca de 3,2 bilhões de pessoas no planeta representam riscos à saúde e ao desenvolvimento, alertam as Nações Unidas. No Brasil, o mote do “combate à seca” no Semiárido perpetuou investimentos públicos voltados para a manutenção de latifúndios e atividades econômicas com baixa preocupação ambiental, que, ao longo do tempo, agravaram o risco de desertificação na região. Revelou-se uma estratégia eficiente na ampliação da desigualdade socioeconômica, com o Estado operando em detrimento de soluções voltadas para a autonomia econômica e política das populações atingidas. Falta ouvir e investir em ações baseadas nos saberes da população que aprendeu a conviver com o bioma da caatinga e as longas estiagens. “Diante dos grandes problemas, não procure dar resposta, faça uma roda de escuta”, ensina em entrevista à Radis o professor Eymard Vasconcelos, homenageado durante o 8º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, em João Pessoa, por sua dedicação à educação popular e saúde, como forma de compartilhamento e troca de saberes.

Em meio ao rebaixamento geral de percepção da realidade e descompromisso com ciência, saúde, educação e ambiente que assola o país, continuar a pensar e trabalhar com seriedade é uma forma de resistência. Há dezenas de instituições públicas, assim como organizações e movimentos sociais representados nas falas das pessoas ouvidas nesta edição. Para a revista Radis, resistir ao desmonte das instituições públicas é continuar praticando um jornalismo de qualidade e crítico em defesa do SUS e dos direitos da população, uma comunicação de interesse público que faça jus ao compromisso inalienável da Fiocruz com a sociedade — razão de sua existência como instituição pública de Estado.

Promovemos o debate sobre as políticas públicas intersetoriais e seu reflexo na determinação social da saúde. Daí a importância de se falar do cuidado com adolescentes e idosos em relação à depressão e ao elevado número de suicídios, tanto quanto dos riscos aos povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos e da biodiversidade amazônica sob ataque de queimadas, desmatamento, expansão do agronegócio, grandes projetos e mineração. Daí a preocupação com a catástrofe do petróleo derramado sobre um quarto do litoral brasileiro, frente à falta de ações imediatas de contingência e a subestimação das consequências econômicas e socioambientais de médio e longo prazo.

As páginas de Radis e seus espaços de interação na internet e redes sociais digitais seguem abertos ao conhecimento produzido pela tradição e as vivências das populações em seus distintos territórios, assim como às teorias e práticas formuladas nos campos da comunicação, da saúde coletiva e de outras ciências que interagem na saúde. Para equalizar essa troca, buscamos, sempre que possível, assegurar o protagonismo de vozes menos ouvidas nos demais meios de comunicação, dentro da academia e das esferas de poder do Estado.