Fotografia: Eduardo de Oliveira.

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A 16ª Conferência Nacional de Saúde (CNS) aprovou uma agenda de lutas em defesa do SUS e da saúde, a serem travadas nos conselhos de saúde, nas casas legislativas, junto aos governos municipais, estaduais e federal e, principalmente, nas ruas, onde a causa do direito de todos à saúde converge com a defesa da educação pública, da diversidade cultural e religiosa, da ciência e tecnologia nacionais, da sustentabilidade ambiental e dos direitos dos povos da floresta e das populações do campo e das periferias das cidades, igualmente atacados por um modelo econômico ultraliberal e políticas e práticas sociais ultraconservadoras.

Precedida por três mil conferências municipais e estaduais, a 16ª CNS reuniu em Brasília, em agosto, três mil delegados, paritariamente distribuídos entre usuários, trabalhadores e gestores/prestadores de serviço. Após calorosas discussões foram deliberadas 31 diretrizes, 329 propostas e 56 moções, que orientam e buscam aperfeiçoar o sistema de saúde ou sugerem mudanças em políticas socioeconômicas e ambientais que prejudicam as condições de vida e saúde da população. Temas como a descaracterização da atenção básica, precarização do trabalho e a privatização da saúde foram alguns dos mais candentes. No diagnóstico dos delegados, o principal problema do SUS é a asfixia orçamentária que o sistema vem sofrendo há vários anos e a retirada de recursos para o seu funcionamento mínimo, representada pela Emenda Constitucional 95 (EC 95/2016), que congela os gastos públicos por vinte anos.

Além dos delegados, duas mil pessoas participaram de atividades paralelas ou como convidados e observadores. Em ato realizado nas ruas de Brasília, lideranças de movimentos sociais discursaram em defesa do SUS e contra a supressão de direitos e o desmonte da seguridade social concebida na Constituição de 1988. O clamor pela revogação da EC 95 foi endossado por seis ex-ministros da Saúde, em um manifesto: “Nenhum sistema universal tem investimentos tão baixos quanto o nosso[...] a EC 95 subjuga as necessidades de saúde da população às metas fiscais[...] divergimos frontalmente de que o SUS não pode ser universal”, afirmaram.

Inspirada no legado da 8ª Conferência, realizada em 1986 e marco histórico na formulação do direito à saúde e dos princípios dos SUS, a 16ª CNS teve como tema Democracia e Saúde, reafirmando o aprendizado da “Oitava” de que uma aspiração não se completa sem a outra. Participantes que acompanharam o processo político e da saúde desde aquele período, ouvidos pela Radis, analisam que a conquista das liberdades democráticas é incompleta quando se mantém a desigualdade social e que sem democracia participativa e liberdade de expressão e comunicação não se consolida o direito à saúde.

Artigo na seção Pós-Tudo desta edição expõe, numa narrativa bastante peculiar, o vínculo médico-paciente, a relação direta entre o estado de saúde ou adoecimento das pessoas e o modo como as condições de vida e as pressões cotidianas afetam sua existência.

As páginas da seção Súmula, que resume e comenta do ponto de vista do campo da saúde coletiva o noticiário recente, foram insuficientes para analisar a catástrofe do desmatamento ilegal e das queimadas criminosas, resultado do abandono, por parte de governos estaduais e federal, das políticas públicas e dos compromissos internacionais multilaterais pelo desenvolvimento sustentável e a proteção do planeta e da vida. Avança sobre as florestas a sanha dos modelos predatórios de pecuária, agricultura, mineração, garimpo e atividade madeireira ilegais, grilagem de terras públicas e grandes projetos, atropelando critérios socioambientais mínimos, desrespeitando a demarcação de áreas indígenas e quilombolas e elevando o grau de violência contra essas populações.

O que acontece hoje na educação também afeta diretamente a saúde dos cidadãos em sua dimensão ampliada. Além do desinvestimento no ensino público a favor da implementação de projetos privatizantes de ensino de baixa qualidade, verifica-se nas escolas e universidades públicas e privadas um número crescente de ataques ao pensamento crítico, próprio do processo de aprendizado e reflexão teórica. Em outros âmbitos da sociedade, manifestações culturais e a liberdade de opinião, constitucionalmente garantidas, são cada vez mais censuradas, impedindo o exercício do direito à comunicação e expressão, inalienável aos direitos humanos que fundam os princípios internacionalmente pactuados na Organização das Nações Unidas, após a ignomínia do conflito mundial desencadeado pela ascensão do nazifascismo, há 80 anos. Nos horrores das guerras entre nações ou civis, não há vencedores. Todos perdem a sua humanidade.