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Iniciando mais uma semana de trabalho com o ensino remoto emergencial por conta da pandemia, liguei o notebook, abri o WhatsApp e procurei por mensagens nos grupos das escolas e as devolutivas de atividades dos estudantes… Até encontrar uma foto que me impactou profundamente.

A escola municipal em que trabalho optou por utilizar o WhatsApp para a comunicação com os estudantes que têm acesso à internet, por ser a via mais acessível. Pelos grupos, nós professores enviamos informações, conteúdos, atividades e recebemos a produção dos alunos no privado ou por meio de preenchimento de formulários. Aqueles alunos que não têm acesso à internet recebem os materiais impressos. Mesmo assim a devolutiva está muito aquém do que poderia ser no ensino presencial.

Neste contexto, o autor da foto, um aluno do 6º ano, queria apenas enviar a atividade feita nos últimos dias, acompanhada de um áudio meio afobado se identificando. Mas ele acabou fazendo um registro impressionante das precariedades de grande parte dos estudantes da rede pública. Quando compartilhei a imagem com outros profissionais da equipe houve comoção e reflexão, pois, por mais que saibamos das dificuldades, a síntese espontânea da imagem impressiona.

O tema da democracia no caderno sobre a mesa, os móveis gastos, os pés negros descalços no chão rústico e a mochila ao lado. Alguns segundos depois de olhar a foto, lembrei-me dos comerciais dos governos na TV e nas redes sociais, como aquele recente das inscrições para o Enem, com os jovens nos seus quartos confortáveis, equipados e decorados com bandeirinhas do Brasil. São condições muito distantes da realidade de grande parte dos alunos e alunas. É revoltante essa situação de desigualdade no Brasil!

A educação pública brasileira tem sofrido com o descaso dos governos e a voracidade dos empresários há muito tempo. E também durante a pandemia, que já tirou a vida de mais de 150 mil brasileiros, além do aumento do desemprego e exposições às vulnerabilidades, as fissuras profundas na realidade das comunidades escolares ficaram explícitas. Ao mesmo tempo, existe muito receio com a possível retomada das aulas presenciais anunciadas pelas autoridades, como é o nosso caso em Minas Gerais, que começou a informar diretrizes e datas possíveis para um processo de retorno.

Se a situação diante da pandemia, como expresso pela foto, é para lá de preocupante, o retorno dessas crianças e jovens às escolas também preocupa muito, como me disse a supervisora da escola, Fernanda Leão: “Quando vi a foto, não teve como não pensar naqueles impossibilitados de tentar. É evidente que a escola faz muita diferença na vida de todos os estudantes. Porém, mais ainda na vida daqueles representados pela imagem. Nos preocupamos em garantir o retorno seguro de todos. No mínimo, teremos que disponibilizar os EPIs (máscaras, álcool em gel, sabão) e garantir que sejam usados corretamente, além de todas as outras medidas de distanciamento, arejamento dos ambientes, higienização constante. Qual escola pública em nosso país tem condições materiais e humanas de oferecer tudo isso sem deixar ninguém desamparado, principalmente os que mais precisam?”

O caminho possível para que não tenhamos mais cenas como as da foto passa pela democracia, com poder ao povo de fato. Para essa outra realidade pela qual lutamos, o trabalho da Campanha Nacional pelo Direito à Educação — que completou em outubro 21 anos — é essencial. Precisamos garantir dignidade e o direito fundamental à educação. Do contrário, corremos o risco de que, daqui a pouco, os flagrantes das mazelas não signifiquem coisa alguma por terem se tornado normais, banais. Não pode ser esse o novo e permanente normal.

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