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Um ano sem fim nem começo, 2021 parece uma suspensão no tempo. Quando a médica da Fiocruz Margareth Dalcolmo alertou para o fato de que teríamos “o janeiro mais triste da nossa história”, ainda não sabíamos que perderíamos tanto. Nos últimos 12 meses, enquanto o Brasil via aumentar o número de mortes da pandemia e as incertezas em relação à vacina contra a covid-19, Radis tentou narrar o que estava por trás das estatísticas e contar as histórias de vida para além dos números. Muitas de nossas matérias foram atravessadas pelas marcas de uma pandemia que ainda não acabou — como fez questão de lembrar outro entrevistado, o neurocientista Miguel Nicolelis. Mas também ouvimos pesquisadores, cientistas, profissionais e trabalhadores da saúde, gente comum, os povos tradicionais sobre uma série de outros temas caros ao debate público. Nas próximas páginas, relembre o que foi notícia nas edições da revista este ano. Todo esse conteúdo está disponível no site: https://radis.ensp.fiocruz.br/.


“Com a epidemia de covid-19, ficou claro que todos os países têm que estar abastecidos para outra eventual emergência. Até porque nós sabemos que a covid-19 não será a última epidemia de nossas vidas, infelizmente.”

[Margareth Dalcolmo, médica pneumologista da Fiocruz, em entrevista à Radis 221/Fevereiro]


Em abril [Radis 223], uma galeria de imagens enviadas por nossos leitores com cenas marcantes da vacinação pelo Brasil nos emocionou ao revelar o esforço dos profissionais de saúde para fazer a vacina chegar aos lugares mais remotos do país.


Patrimônio brasileiro, Programa Nacional de Imunizações perde poder de decisão e abre brechas para os fura-fila da vacinação contra covid-19
— Capa: Ilustração digital de Felipe Plauska.

Na capa da edição de maio [Radis 224], procuramos por Zé Gotinha, o icônico personagem que desde 1986 representa o Programa Nacional de Imunizações (PNI). Patrimônio brasileiro, o PNI vinha perdendo poder de decisão e abrindo brechas para os fura-fila da vacinação contra a covid-19. Em entrevista, Carla Domingues, que havia sido coordenadora do PNI entre 2011 e 2019, chamava a atenção para os erros de comunicação e planejamento que vinham sendo cometidos durante a pandemia e que podiam comprometer a credibilidade das vacinas no Brasil. E reforçava: “Graças à vacinação no SUS, mudamos completamente o perfil epidemiológico e de vida da população brasileira, a ponto de termos um programa reconhecido mundialmente por levar vacina a todos os cidadãos independentemente de onde moram, sua condição de vida, sua remuneração”.


“Nossa morte não escandaliza mais ninguém.”

[Bruno Sousa, coordenador de comunicação do LabJaca, um laboratório de dados e narrativas sobre favelas e territórios periféricos, localizado na favela do Jacarezinho-RJ, em entrevista à Radis 226/julho]

Jovem, negro, morador de favela, estudante de jornalismo e pesquisador de segurança pública, Bruno falou sobre racismo e violência policial com coragem e sensibilidade. O racismo foi tema de outras pautas e muitas conversas na equipe de Radis. Já em nossa edição de janeiro [Radis 220], trouxemos na capa da revista uma discussão sobre representatividade, a partir dos resultados das urnas nas eleições de 2020. A votação expressiva de transexuais, mulheres negras, indígenas e quilombolas nos levou a ouvi-las sobre um debate que ainda tem muito a avançar. “Não podem nos interromper”, disse na ocasião Benny Briolly, negra e a primeira vereadora transexual de Niterói — Benny Briolly voltaria às nossas páginas, quando noticiamos em junho [Radis 225] sua decisão de deixar temporariamente o país, após seguidas ameaças de morte.


518.776

Com mais de meio milhão de mortes pela covid-19, Brasil poderia ter evitado ao menos 400 mil delas, aponta pesquisa
— Capa: Ilustração digital de Felipe Plauska.

Esse era o número estampado na capa da nossa edição de julho [Radis 226]. Uma espécie de “contador” de vidas perdidas evidenciava o incontável, o inaceitável: havíamos ultrapassado a marca de meio milhão de óbitos por covid-19. Quando a revista chegou às bancas, esse número já era maior — e, no momento que fechamos esta retrospectiva, já somamos mais de 614 mil mortos. Por isso, naquela ocasião, a nossa opção gráfica: um contador que não para, desafiando a rigidez da página impressa. Perdemos muitos. Perdemos demais.


Perdemos o Norte?

Em meio a toda a tragédia da pandemia, uma reportagem há muito tempo imaginada discutiu a invisibilidade da região Norte do país e os impactos disso na vida de seus habitantes — inclusive no que diz respeito ao acesso e à manutenção da saúde. A partir dos relatos de pessoas que nasceram e/ou moram em diferentes cidades do Norte, nós descobrimos, por um lado, uma série de problemas que não encontram repercussão na mídia “sudestina” e, por outro, realidades complexas e muito diversas, dentro da mesma região.  A matéria de 10 páginas publicada em nossa edição de maio [Radis 224] é um verdadeiro convite para embarcar em uma viagem que questiona a nossa ignorância e problematiza estereótipos. “O Norte só é noticiado quando há tragédia ou quando há festa”, disse na ocasião Jaider Eisbell, o artista plástico macuxi que faleceria meses depois, em novembro (2/11), aos 41 anos.


A negação dos fatos

Como o negacionismo atrapalha a busca da humanidade por saúde e conhecimento
— Capa: Ilustração digital de Eduardo de Oliveira

Nossa reportagem de capa de abril [Radis 223] mostrou como a desinformação pode confundir pessoas e prejudicar a busca por conhecimento. Para aprofundar a discussão, conversamos com pesquisadores e cientistas que sofriam os efeitos nefastos do negacionismo. Popularizado no contexto da pandemia para se referir a medidas que contrariam a ciência, o termo também pode ser empregado em outros contextos — que vão das crenças de que a Terra é plana (e não redonda) até posições políticas que questionam o aquecimento global, o Holocausto e a ditadura civil-militar. “Uma das estratégias do negacionismo é entrar no debate não para ampliar o conhecimento, mas para destruir”, constatava o historiador e professor da Universidade de São Paulo (USP), Marcos Napolitano, defendendo que devemos enfrentar os negacionismos com coragem.


“A Amazônia pede socorro. Não é só a gente que tem que defender. O mundo todo tem que saber o que está acontecendo.”

[Alessandra Korap, do povo Munduruku, uma das entrevistadas para a reportagem Povos contra a devastação, nossa capa de agosto/Radis 227]

Para mostrar a agonia da floresta, nosso editor Luiz Felipe Stevanim conversou com representantes dos povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e outras comunidades tradicionais. Os relatos contam como eles atuam na busca de alternativas e soluções que reduzam o impacto do desmatamento, da degradação ambiental e de incêndios criminosos. Nesta edição, o título do nosso Editorial foi enfático “A boiada avança sem pedir licença” — numa referência à expressão consagrada em uma reunião ministerial de 2020, quando o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chegou a dizer que a pandemia era a oportunidade para “ir passando a boiada e mudando todo o regramento” na área ambiental.


Deu na Súmula

O leitor de Radis já está familiarizado com a seção de notas breves publicadas nas páginas iniciais da revista a cada edição. Intitulada Súmula, essa seção se propõe a fazer uma resenha crítica sobre o que ocupou o noticiário ao longo do mês. Em 2021, passaram por esse espaço assuntos diversos: das mudanças na política de saúde mental que ameaçavam a reforma psiquiátrica [Radis 220] às discussões no Congresso sobre o Marco Temporal [Radis 226]; do incêndio na Cinemateca Brasileira [Radis 227] até o fim do Bolsa Família ou a realização da 26ª Conferência do Clima (COP26) [Radis 230]; sem contar todo o debate que aconteceu na imprensa sobre vacinas. Quando o Brasil e o mundo discutiam a necessidade de uma dose de reforço, falamos sobre isso na Radis 228. Quando a CPI da covid investigava toda uma rede de corrupção envolvendo a compra de vacinas pelo governo brasileiro, também [Radis 226]. Alguns desses assuntos mereceram um olhar mais demorado em matérias que funcionavam como uma espécie de súmula ampliada, como foi o caso da cobertura sobre o caos provocado pela falta de oxigênio em Manaus [Radis 221] ou ainda quando a pandemia de covid 19 escancarou contradições da saúde global, com países ricos vacinando e países pobres em espera [Radis 222].


“Para combater um inimigo coletivo, temos que ter um contra-ataque comunitário. Não dá para atacar o vírus com medidas isoladas.”

[O neurocientista Miguel Nicolelis falou à Radis sobre a negligência dos políticos brasileiros com a ciência durante a pandemia, em uma entrevista à repórter Liseane Morosini, publicada na nossa edição de setembro/Radis 228. Segundo ele, “O SUS salvou o Brasil de uma tragédia maior”]


116,8 milhões 

Esse é o número de brasileiros que vivem algum grau de insegurança alimentar. 

Fomos em busca do que está por trás do número — que corresponde a mais da metade da população do país — em uma reportagem que conta histórias de quem vive cotidianamente o assombro de não ter comida no prato e também daqueles que vêm fazendo algo para aplacar a fome com iniciativas solidárias. Na nossa reportagem de capa de junho [Radis 225], ouvimos ainda Francisco Menezes e Elisabetta Recine, dois ex-presidentes do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), para entender o que colocou o Brasil de novo na rota da fome. 


“Tem pessoas que não vão à clínica. Uns por preguiça, outros por se sentirem estigmatizados, outros porque não conseguem ir mesmo. Mas o Consultório está sempre ali pra gente. Ninguém deixa de ser medicado ou de fazer exame.”

[Lilian Lionel, redutora de danos que vive numa cena de uso no Rio de Janeiro, ao falar sobre a importância do Consultório na Rua, estratégia de saúde pública que há 10 anos vem levando o SUS a uma população excluída das políticas públicas. Nossa repórter Ana Cláudia Peres acompanhou a rotina de uma equipe de Consultório na Rua durante uma saída de rotina. Com a reportagem publicada na edição de outubro/Radis 229, voltamos com o nosso jornalismo às ruas, ainda levando em conta todos os cuidados que a pandemia exige]


Livros etc

A cada edição, nossa página de serviço trouxe uma seleção de livros, filmes, séries, podcasts, exposições, seminários para ajudar a compreender melhor o nosso tempo. Algumas dessas dicas se desdobraram em matérias. Aproveitamos o lançamento do livro Micro: Contribuições da Antropologia e conversamos com as autoras, mas também com as mães de crianças que nasceram com microcefalia durante a epidemia de zika, há cinco anos [Radis 222]. Em maio, entrevistamos Itamar Vieira Junior, autor de Torto Arado, um dos mais comentados romances de literatura brasileira dos últimos tempos [Radis 224], enquanto o livro A bailarina da Morte, de Lilia Schwarcz e Heloisa Murgel Starling, rendeu uma matéria sobre semelhanças entre a pandemia de gripe espanhola em 1918 e o momento atual [Radis 223]. E, em setembro, o livro Direito à Comunicação e Saúde foi o mote para uma bate-papo entre os autores Luiz Felipe Stevanim, editor de Radis, e Rodrigo Murtinho [Radis 228]. Também fizemos uma visita guiada pela exposição Nise da Silveira — a Revolução pelo Afeto, que reuniu a produção do Museu de Imagens do Inconsciente e obras de artistas contemporâneos em homenagem à psiquiatra alagoana [Radis 226].


“As pessoas acham que não vão envelhecer.”

[Karla Giacomin, coordenadora da Frente Nacional de Fortalecimento das Instituições de Longa Permanência (ILPIs), ouvida para a reportagem Cuidado Continuado [Radis 223/Abril], que trouxe muitos relatos que revelam lacunas nas políticas públicas voltadas para o envelhecimento populacional no Brasil]


Outras conversas

Na matéria A Outra Pandemia publicada em março [Radis 222], nosso subeditor Bruno Dominguez discute como a covid-19 impactou a atenção às pessoas vivendo com HIV/aids no Brasil. A propósito, os 40 anos da pandemia de aids são o tema da reportagem de capa desta edição de dezembro, que aborda uma questão invisibilizada: o cotidiano de mulheres vivendo com HIV/aids [leia mais na página XXXX]. Em 2021, também narramos as vidas das pessoas com vitiligo, em A Pele que Habito [Radis 229], e nos preocupamos com a esquistossomose, doença que permanece endêmica em regiões do Brasil pela falta de saneamento básico, em Contaminação em Ciclo [Radis 227]. Os 100 anos da BCG, a vacina que protege as crianças da tuberculose, também mereceram o olhar apurado da equipe da revista em Vacina Centenária [Radis 228], matéria assinada por nossa estagiária Moniqui Frazão. E a recente polêmica envolvendo a pobreza menstrual virou ponto de partida para uma conversa sobre dignidade das mulheres e violação de direitos com Anna Cunha, oficial para Saúde Sexual e Reprodutiva do Fundo de População da ONU [Radis 230]


“Nós estamos vivendo um massacre. E cada um, à sua maneira e como pode, tem que tentar resistir ao massacre”

[Padre Julio Lancellotti, em entrevista à Radis 230/novembro. Para o encontro com o sacerdote, nosso repórter Adriano De Lavor foi até São Paulo para depois narrar com riqueza de detalhes aos leitores a rotina de solidariedade de um dos líderes religiosos mais atuantes durante a pandemia de covid-19]


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