Em 2024, Radis reportou pesquisa com mulheres migrantes venezuelanas na região Norte, projeto que fez confluírem temas que a revista tem destacado como a saúde nos processos de migração ou refúgio e a saúde das mulheres e crianças, em especial, os desdobramentos da gigantesca pesquisa “Nascer no Brasil”, coordenada por Maria do Carmo Leal.
Seria natural que a pesquisadora da Ensp/Fiocruz fosse entrevistada com destaque no contexto da matéria das mulheres migrantes, projeto no qual ela também desempenhou um papel central.
No entanto, decidimos aguardar para realizar agora essa entrevista ainda mais abrangente, em que ela fala de sua vida e experiências profissionais num espaço privilegiado, o rol de grandes sanitaristas, em que a maioria dos nossos convidados ou homenageados tem sido figuras masculinas.
Portanto, aqui está uma entrevista mais do que especial conduzida pelos jornalistas Adriano De Lavor e Luiz Felipe Stevanim, durante um encontro na redação de Radis em que estiveram presentes, além da nossa equipe, algumas das mais próximas pesquisadoras que trabalham com Maria do Carmo, conhecida desde a juventude, nos meios acadêmicos e na Fiocruz pelo carinhoso apelido de Duca.
Em matéria de dez páginas da revista impressa e em uma versão ainda maior disponível em nosso site, os leitores vão conhecer a trajetória de Maria do Carmo, desde os estudos no interior e na capital da Bahia, quando se formou em medicina. Formou-se sanitarista, professora e pesquisadora nas instituições de medicina social e saúde coletiva do Rio de Janeiro, coordenou e participou de pesquisas essenciais de saúde no país, dentre elas algumas das principais sobre saúde da mulher, como a “Nascer no Brasil” e, em breve, a primeira pesquisa de abrangência nacional sobre aborto no Sistema Único de Saúde.
Duca nos emocionou ao narrar seu convívio com os formuladores da saúde coletiva, a descoberta do Brasil real nas pesquisas de campo, a percepção do vínculo indissociável da saúde com a democracia e os direitos humanos e ao dizer que o seu trabalho como pesquisadora está completamente voltado à construção do SUS.
Primeira e até hoje única diretora da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (1993-1994), ela surpreende ao falar do lugar da mulher na medicina e nas instituições acadêmicas, espaços dominados pela masculinidade. Vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz (2005-2010), Duca fez questão de falar sobre a importância da comunicação na saúde.
Esta edição tem muito de humanização na saúde. Reportagem de Jesuan Xavier mostra o que há por trás do trabalho de atores palhaços que visitam e tornam mais leves os ambientes hospitalares. Izabelly Nunes traz uma resenha que convida à leitura de “Para morrer como um passarinho: histórias reais de amor, cuidado e redenção no fim da vida”. O livro reúne crônicas curtas sobre a experiência de um estudante de medicina inserido em uma equipe de cuidados paliativos.
Refletimos também sobre desumanização. Na seção Súmula, o médico e palestrante Rubens Harb Bollos analisa a minissérie Adolescência, lançada pela Netflix em 2025, que tem provocado grandes debates sobre redes sociais digitais, saúde mental, as relações entre os jovens e o lugar dos adultos nesse universo. Na reportagem “É diversão para quem?”, Lara Souza discute como o bullying em ambiente escolar afeta ainda mais as crianças e os adolescentes com deficiência.
A seção Súmula dá ênfase a notícias relacionadas à proteção à saúde e ao ambiente. O surto de sarampo nos Estados Unidos, onde o negacionismo governamental e social levou a uma drástica queda na vacinação, preocupa o Brasil. Para Margareth Dalcolmo, da Fiocruz, “já é hora de o Brasil começar a pedir certificado de vacina para sarampo aos norte-americanos que vierem ao país”. Estudo da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro constata a presença de metais tóxicos nos cigarros eletrônicos comercializados ilegalmente no Brasil.
No futebol, episódios de racismo continuam roubando a bola das confederações esportivas, como no caso de declarações discriminatórias do presidente da Conmebol, Alejandro Domingues, repudiadas por diversas entidades e pelo governo brasileiro.
Na convocação global das Nações Unidas para o enfrentamento às mudanças do clima, o embaixador André Corrêa, presidente da COP 30 a ser realizada em Belém, alerta que a mudança dos processos econômicos que afetam o clima será “por escolha ou por catástrofe”. Entre as boas notícias, a queda de 71% nos casos de dengue no país. Pesquisadores da Universidade de São Paulo estão desenvolvendo um novo tratamento para os casos graves de febre amarela. E, na troca de ministros, com a saída de Nísia Trindade e entrada de Alexandre Padilha, segue o compromisso com a continuidade da reconstrução do SUS e com a sua inegociável defesa.
■ Rogério Lannes Rocha, coordenador e editor-chefe do Programa Radis
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