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No mês da Consciência Negra, Radis resgata a memória de Lélia Gonzalez, uma das mais importantes pensadoras brasileiras do século 20, pioneira do movimento feminista negro, referência antirracista e antimachista. Lélia nos deixou — ou se fez eterna, como gosta de ressaltar sua neta Melina de Lima — de forma precoce, aos 59 anos, em 1994. Mas segue imortalizada em suas obras e pensamentos, cada vez mais conhecidos, acessados e estudados no Brasil e no mundo. Credenciais não lhe faltam: historiadora e geógrafa, filósofa, educadora, comunicadora, antropóloga, escritora, ativista, articuladora cultural e o que mais se propusesse a ser. 

Nascida em Minas Gerais, em 1 de fevereiro de 1935, e vinda de origem pobre, Lélia de Almeida era filha de um ferroviário negro e de uma trabalhadora doméstica indígena. Mudou-se com sua família ainda criança para o Rio de Janeiro, onde Jaime de Almeida — o mais velho de seus 17 irmãos — vingou na carreira futebolista e foi jogar no Flamengo. Naquela época, porém, profissionalizar-se em um clube de ponta no futebol, ainda que permitisse uma certa mobilidade social, não significava a independência financeira familiar, como ocorre com mais frequência com aqueles que alcançam esse status nos dias atuais. 

Na nova cidade, ela ainda precisou conciliar os estudos com o trabalho de babá por um tempo, mas talvez por ser a penúltima de 18 filhos e a caçula entre as mulheres, teve a oportunidade de prosseguir com os estudos por mais tempo em comparação com seus irmãos. Cursou todo o ensino fundamental na rede pública de ensino do Rio de Janeiro e no ensino secundarista ingressou no tradicional Colégio Pedro II. “Isso dá uma virada forte [na vida dela], porque para uma pessoa que vai para o Pedro II, uma adolescente negra, isso gera muitas possibilidades”, afirma a socióloga Flavia Rios, uma das organizadoras do livro Por um feminismo afro-latino-americano (Editora Zahar, 2020), obra que reúne os principais textos de Lélia entre 1979 e 1994.

Sua múltipla formação e atuação interdisciplinar a ajudaram a transitar em diferentes áreas com maestria. Além das graduações em história e geografia — na época cursadas juntas — e em filosofia, ambas pela antiga Universidade do Estado da Guanabara, hoje Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Lélia fez o mestrado em comunicação e o doutorado em antropologia. 

Depois, mergulharia também na psicanálise — indo de Freud a Lacan — e no candomblé, onde encontrou aportes para as teorias raciais e de gênero que desenvolveu. Como docente, lecionou em instituições privadas e públicas do Rio de Janeiro, do nível básico ao ensino superior, e seu último cargo foi de diretora do Departamento de Sociologia e Política da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).

Conceitos que hoje são cada vez mais difundidos, como decolonialidade, interseccionalidade e racismo estrutural já eram cunhados e debatidos por Lélia na década de 1980. “Ela teorizou a luta das mulheres negras e da população negra quando nem existiam esses conceitos”, orgulha-se Melina, neta e historiadora. Lélia também cunhou expressões como pretuguês e amefricanidade, e propôs uma visão afro-latino-americana do feminismo.

O ativismo político também marcou sua trajetória. “Ela tem um legado político de formação democrática. Lélia é uma das fundadoras do PT [Partido dos Trabalhadores] e do Movimento Negro Unificado (MNU)”, ressalta Flavia. A pensadora chegou a concorrer a dois cargos eletivos: como deputada federal pelo Rio de Janeiro, em 1982, pelo próprio PT, e deputada estadual, em 1986, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), ficando como suplente em ambos os pleitos. 

Já conhecida no movimento negro, até pouco tempo Lélia ainda não estava à vista de grande parte do público que hoje tem acesso à sua obra. Há apenas 5 anos, em outubro de 2019, a renomada ativista antirracista estadudinense Angela Davis esteve em São Paulo ministrando a conferência A Liberdade é uma luta constante, durante o Seminário Internacional Democracia em Colapso?. Em dado momento, ela disse à plateia que a referência que buscavam para pautas raciais e de gênero estava muito mais próxima de nós do que muitos imaginavam. E citou a amiga Lélia Gonzalez como inspiração, dizendo ter aprendido mais com a obra da ativista do que ela mesma poderia ensinar aos brasileiros. Foi a senha para um despertar.

Para Marcelo de Lima, outro neto de Lélia, apesar do vasto currículo e das contribuições políticas, sociais, culturais e acadêmicas da avó, o racismo e o machismo — justamente mecanismos sociais discriminatórios combatidos por ela — contribuíram para que esse reconhecimento tardasse a chegar. Radis abordou esses temas e muitos outros com a socióloga Flavia Rios e com o núcleo familiar mais próximo de Lélia: seu filho, Rubens Rufino, e netos, Marcelo e Melina, a fim de revelar algumas das muitas camadas dessa importante intérprete do Brasil.

Lélia: de Almeida a Gonzalez

Registros biográficos de Lélia narram uma importante transformação em sua produção acadêmica e militância política a partir de uma tragédia pessoal: o suicídio de seu marido, o filósofo espanhol Luiz Carlos Gonzalez, de quem Lélia herdou o sobrenome e fez questão de evidenciá-lo, como homenagem. Ambos haviam sido colegas de universidade, onde começaram a se relacionar. Relatos indicam que a família do espanhol tolerava o namoro, mas não aceitou o casamento, ocorrido em 1964, por ela ser negra e ele branco. E passaram a destratar Lélia. Farto da pressão familiar, ele tirou a própria vida no ano seguinte ao casamento.

Lélia, então, sentiu na pele as consequências do racismo e do mito da democracia racial, que viria a ser uma de suas principais bandeiras de luta. Para isso, teve que questionar um discurso fantasioso de um Brasil próspero e equânime, que era propagado pela ditadura militar. “Uma das primeiras coisas que ela fez, no final da década de 1970, foi denunciar a falácia da democracia racial. Isso foi um marco dentro da sua história como ativista. Nós vivíamos no período da ditadura militar, em que havia o milagre econômico e a ‘democracia racial’, só que isso não condizia com a verdade que vivenciávamos tanto socioeconômica quanto culturalmente”, revela Rubens.

Antes de se tornar Gonzalez, portanto, Lélia de Almeida passa por todo o processo de luto, conflitos e autorreconhecimento. E percebe que as teorias hegemônicas com as quais tinha contato não davam conta de responder às contradições que passou a confrontar. Foi quando despertou de vez para as pautas sociais, incluindo a luta racial. Em algumas entrevistas, a intelectual reconheceu que durante sua formação estudantil havia passado, sem notar, pelo chamado processo de embranquecimento, como relata Rubens: “Lembro quando eu era criança, nos anos 60, minha mãe usava peruca. Depois se tornou uma grande ativista do movimento negro”, narra. 

Flavia aprofunda a discussão ao citar uma passagem em que Lélia fala abertamente sobre o tema em uma entrevista. “Ela diz: — “Eu venho de uma família indígena e negra, quando chego na escola pública começam a falar de estigmas, que o negro é escravo, que o indígena é indolente”. Então ela tinha que ser outra coisa. Por que uma criança vai chegar na escola e querer ser aquilo que é tido como ruim e feio?”, questiona a socióloga. “Isso é o processo do embranquecimento, quando você adentra um sistema escolar e toda sua educação nega quem você é e você tem que se tornar outro”, completa Flavia.

Interseccionalidade: uma teoria das desigualdades

Foi no movimento feminista, também no fim dos anos 70, que Lélia começou a trabalhar o conceito de interseccionalidade, ao compreender que as mulheres brancas sofriam injustiças, opressões e iniquidades, mas não tanto como as mulheres pretas. Posteriormente, na luta racial, também levou aos homens negros do MNU a visão de que era preciso olhar para a causa das mulheres pretas.

Flavia ressalta que, para teorizar sobre a interseccionalidade, Lélia teve que cruzar saberes dos diversos campos de sua formação: “Para olhar essas complexidades, essas contradições sociais tão concretas, ela precisou de todas as leituras de psicanálise, filosofia, sociologia, antropologia, análise da cultura, demografia, e construir uma teoria social robusta para poder interpretar esse fenômeno”.

Lélia atenta para esse entrelaçamento entre os marcadores de classe, raça e gênero. “É uma teoria que precisaria considerar a multicausalidade. Ela é uma teórica das desigualdades e quer entender como essas desigualdades se estruturam e se reproduzem, quem é esse sujeito e como se rompe isso”, explica Flavia.

Pretuguês e amefricanidade: conceitos decoloniais

Ao expandir sua análise para além das fronteiras nacionais e dar luz às diferentes culturas que moldam as nações do continente americano, Lélia Gonzalez utiliza o conceito de decolonialidade — pelo qual os povos contam suas histórias por si e não pela narrativa eurocêntrica dos colonizadores. E propõe o desenvolvimento de novas identidades políticas no continente, como ameríndios e afro-americanos.

Daí vem o conceito de amefricanidade, muito trabalhado por ela e que expressa essa presença da cultura africana e indígena em países da América, constituindo uma identidade afro-latino-americana. Melina explica que esse conceito consiste em valorizar o protagonismo da população negra e dos povos originários na construção cultural do Brasil. “É sair da caixinha branca e europeia e entender que tivemos essa influência na formação do nosso país e do continente”.

Outra criação de Lélia, o termo “pretuguês” é a forma como ela conceituou a africanização da língua portuguesa. Assim ela se referia ao idioma falado no Brasil, demarcando as contribuições dos africanos à fala e à escrita no país. Não é o português de Portugal, é o português do Brasil, único. Flavia também analisa essas terminologias criadas e trabalhadas por Lélia: “Quando ela constrói o conceito de amefricanidade, ela quer trazer à cena aquilo que fica encoberto e apagado”. 

Flavia reforça a fala de Melina, de que as teorias de Lélia valorizavam as contribuições culturais indígenas e africanas para a formação do povo brasileiro, ocultadas com a ideia de mestiçagem: “Afinal, se todo mundo é mestiço, para que você vai resgatar a sua origem? Então, ela rompe com essa teoria. A ideia de homogeneizar é apagar todas as outras coisas, principalmente aquelas que não são bem vistas. Lélia defendia justamente o contrário, que déssemos o protagonismo para as culturas que são a base da nossa formação”. E encontrou na psicanálise uma forma de perceber o que está escondido nas narrativas hegemônicas: “Ela trabalhou muito com conceitos da teoria psicanalítica, e isso a ajudava a pensar o que estava oculto na nossa cultura. O que a gente negava? Um racismo por denegação”, analisa.

Uma pensadora à frente de seu tempo

Uma evidência da consistência e relevância das teorias de Lélia é que elas permanecem atuais, como frisa Rubens. “Se você ler um texto dela hoje, parece que acabou de ser escrito. Coisas que foram escritas há 40 anos. É muito atual, ela estava à frente do tempo e, por conta de um racismo que ainda permanece no Brasil, a gente viu a necessidade de continuar o trabalho dela, que é um trabalho muito bonito”, diz em referência ao Instituto Memorial Lélia Gonzalez, fundado em 2023 e dirigido pela família. “Ela abriu mão da vida pessoal para lutar pelo povo negro”, destaca.

Marcelo concorda com a avaliação de seu pai. “Ela ainda é a principal referência sobre tudo o que falou, mesmo completando 30 anos de seu falecimento”. O neto diz acreditar que até então não tínhamos maturidade para entender e aprofundar temas levantados por Lélia em suas entrevistas, palestras e escritos. “Basicamente começamos a debater agora questões que ela trouxe. Começamos a entender coisas que ela falava lá nos anos 80. Isso é um pouco do tom e da marca da originalidade”, afirma. 

Por outro lado, Melina lamenta que lutas travadas pela avó há 50 anos ainda estejam em pauta. “Todo mundo que lê Lélia Gonzalez fala que é muito atual. Eu preferiria que não fosse tão atual, queria que já tivéssemos superado isso”. E complementa: “Não dá para falar do nosso país sem falar de racismo, sem falar que não vivemos uma democracia racial. Somos 56% da população e, infelizmente, os piores índices de violência, de morte e de acesso são da população negra, a maior do país”.

Dentre outras habilidades, Lélia era poliglota e autodidata. Falava e escrevia em inglês, espanhol, francês e italiano, o que ajudou que se tornasse uma pensadora de alcance internacional. “Ela escreveu sua obra em pelo menos quatro línguas e idiomas muito importantes no mundo”, aponta Flavia. Com isso, “internacionaliza o Brasil e hoje está em currículos acadêmicos em várias universidades europeias, africanas e estadunidenses”. 

A aptidão com idiomas contribuiu também para que Lélia viajasse por diversos países. Flavia lembra que a pensadora brasileira participou de Conferências das Organizações das Nações Unidas (ONU) entre 1975 e 1985, na chamada Década da Mulher da entidade. A socióloga conta que Lélia palestrava nos eventos e isso lhe abria portas para convites em universidades mundo afora e rendia entrevistas veiculadas no exterior. Com isso, Lélia conheceu novos lugares ao passo em que também ficou conhecida. Foi como Angela Davis e ela se conheceram, assim como outras ativistas internacionais. “Ela teve uma circulação na América Latina, no Caribe, nos Estados Unidos, na Europa, na África, realmente uma intelectual muito cosmopolita”.

Lélia mãe e avó 

Rubens, Marcelo e Melina compartilham com Radis um pouco da vivência com Lélia fora do papel de ativista ou intelectual, embora educar fosse um gesto natural de sua personalidade. “Ela foi mãezona e vózona com Melina e Marcelo”, entrega o filho Rubens. “Ela tinha essa preocupação em educar para a sociedade racista que ainda vivemos. Acho muito legal a preparação que ela me deu para enfrentar o racismo”, diz ele, lembrando ainda que as reuniões do Movimento Negro Unificado (MNU) aconteciam em sua casa. “Eu acabava absorvendo todo aquele conhecimento, histórias e vivências”.

Melina tem a memória da avó como uma pessoa alegre e que não passava despercebida. “Ela era um acontecimento, onde chegava todo mundo via, paravam para olhar, para escutar. Mas ela era uma avó muito carinhosa. Não cozinhava, mas lavava a louça, então lembro sempre dela lavando a louça”, recorda. Melina tinha apenas 8 anos quando Lélia “se fez eterna”, mas isso não a impediu de sentir o acolhimento da avó em momentos marcantes de sua vida, como o reconhecimento de sua sexualidade, mais tarde.

“Ela já estava, nos anos 80, defendendo essa pauta, sendo aliada da luta LGBTQIA+. Então quando eu me entendi como uma mulher lésbica, eu não tive limites. Pensei: minha avó me apoiaria”, conta. “Ela sempre se colocou e se posicionou, então mesmo não estando mais aqui fisicamente, nós sabemos o caminho, as ações e as decisões que ela tomaria”.

O neto Marcelo identifica na avó traços de sua própria personalidade. “Não tem como ler e não se influenciar. Então, sem dúvida, eu sou quem sou hoje por influência dela”. Segundo ele, a avó inspirou toda a família. 

Marcelo passou a compreender melhor a relevância da avó na adolescência, no ano 2000, com a publicação do Dicionário Mulheres do Brasil (1500-2000), editado pela Rede de Desenvolvimento Humano (Redeh), um livro com a memória de mulheres históricas do país. “Foi aí que me toquei que a minha avó era, de fato, uma intelectual e uma pessoa muito relevante. E fiquei um pouco mais atento, porque antes ela estava muito no lugar de avó”, revela. 

Dela, herdou também o legado dos estudos. “Ela permitiu que meu pai acessasse outros lugares e, consequentemente, os lugares que ele conseguiu acessar me permitiram estar onde eu estou hoje, de ter feito um mestrado, por exemplo. Isso é um legado que ela deixou”, celebra. 

Rubens tinha um papel crucial, mas também privilegiado nas publicações de Lélia. Era dele, muitas vezes, a missão de datilografar os textos da mãe: “Uma coisa que me dá muito orgulho é que o livro Lugar de Negro (1982) foi todo batido [à máquina de escrever] por mim, só depois foi para a editora. Foi algo que me marcou, não só a convivência e o aprendizado, mas a formação que ela me deu. Ela era muito preocupada que eu assumisse minha negritude e vivesse como um homem negro para enfrentar o racismo”. 

Pode-se dizer que, para Melina, a avó foi uma espécie de heroína, em quem se inspirou. Hoje ela atua na salvaguarda de sua memória, como diretora de cultura e educação do Instituto Memorial Lélia Gonzalez e à frente do Projeto Lélia Vive: “Ela militava em todos os espaços e reconhecia a importância da representatividade e da nossa existência. É um orgulho danado ser neta dessa grande, urgente e necessária figura”, celebra.

Obras e memória

Lélia Gonzalez está por toda parte. Foi reeditada recentemente por grandes casas editoriais – há muito tempo sem lançamentos cuidadosos de sua produção intelectual. É lembrada por exposições sobre sua vida e ativismo em grandes capitais do Brasil: Salvador, Belo Horizonte  – onde em junho de 2024 ganhou uma estátua em tamanho real, ao lado de Carolina Maria de Jesus – e São Paulo. Está pintada no muro de sua antiga casa, número 106 da Ladeira de Santa Teresa, região Central do Rio de Janeiro. E foi homenageada com uma bandeira criada pela artista Rosana Paulino, hasteada no Museu de Arte do Rio (MAR) durante o ano de 2022.

“Tivemos o lançamento agora [em julho de 2024] do livro Festas Populares no Brasil, reeditado pela Boitempo, que é um trabalho bem de antropóloga, de entender a importância das festas no nosso país continental e a grandiosidade da nossa cultura e a influência negra, dos nossos ancestrais africanos e indígenas na construção desse país”, ressalta Melina, ao falar sobre a nova edição do único livro que Lélia escreveu sozinha, em 1987. Na ocasião, a obra teve baixa tiragem, com circulação restrita, e agora ganha nova abrangência. O segundo e mais conhecido livro dela foi Lugar de Negro, escrito cinco anos antes, em 1982, em coautoria com o sociólogo argentino Carlos Hasenbalg.

Além de todo o engajamento e militância política, Lélia esteve ligada também a diversos círculos artísticos e culturais. Dentre essas atuações, ela participou da Escola de Samba Quilombo, inaugurada pelo sambista Candeia, criou o curso de cultura negra na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, na década de 1970, e foi uma das fundadoras do Instituto de Pesquisa das Culturas Negras e do Coletivo de Mulheres Negras N’Zinga. Fez-se presente até mesmo na criação do grupo Olodum, na Bahia. Parte de toda sua rica história tem sido recuperada e guardada pela própria família, que criou o Instituto Memorial Lélia Gonzalez e o Projeto Lélia Vive. Tudo conforme a vontade dela, como relata Melina.

“O impulso foi a própria Lélia, era um sonho da minha avó. Ela falava: ‘Por favor, toquem o meu legado. Não deixem esses estudos ficarem por aqui. Vamos dar luz a isso’.” Para a historiadora, a família estar à frente desse projeto é sinal de orgulho. “Nós somos os diretores. Meu pai é diretor executivo, minha tia [Eliane de Almeida] é vice-diretora executiva, meu irmão é diretor administrativo-financeiro, eu sou diretora de cultura e educação, e a Dulce [Maria Pereira], grande amiga e quase irmã de Lélia, é a diretora institucional”, elenca. “É uma ação bem da família, inclusive é importante termos esse reconhecimento porque é uma família preta de uma intelectual preta. Queremos manter esse legado vivo e, principalmente, respeitado”.

Uma boa notícia é que Lélia é hoje a autora mais vendida em feminismo negro na plataforma Amazon, cita Melina. “Enfim, o reconhecimento está chegando. Espalhar o legado dela é justamente fazer as pessoas entenderem que somos gigantescos e grandiosos, ancestralmente, inclusive. Vamos decolonizar a academia e as escolas”, conclui.

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