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Um Sistema Único de Saúde (SUS) que realmente atenda a todos, que chegue aos locais mais distantes do país, e que principalmente respeite as diferenças culturais das diversas populações. Essa é apenas uma das lutas do quilombola Mateus Brito que, em entrevista à Radis (18/9), durante evento comemorativo aos 35 anos do SUS, em São Paulo, reconheceu os enormes avanços alcançados pelo sistema, mas lançou novos desafios para o futuro.

“Temos que enfrentar o desafio da equidade, o desafio de um Sistema Único de Saúde que seja público, universal, mas que seja sobretudo equânime e que consiga adentrar os territórios quilombolas numa perspectiva que respeite, valorize e reconheça as tradições, os saberes, as práticas, a identidade étnico-racial e cultural dessas comunidades”, disse.

Doutorando e mestre em saúde coletiva pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Mateus participou da mesa de abertura do Seminário SUS 35 Anos, na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Radis esteve presente nos dois dias do evento (18 e 19/9), organizado pelo portal Outra Saúde em conjunto com o Instituto Walter Leser, a Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro) e o Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Santa Casa de São Paulo.

“Esse momento é super importante para a gente poder refletir sobre os avanços e os desafios do Sistema Único de Saúde, sobretudo pensando na realidade dos territórios quilombolas, dos territórios indígenas, das localidades rurais e remotas dos campos, das florestas e das águas”, pontuou Mateus, que também integra a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).

Ele defendeu que o SUS possa, de alguma forma, incorporar os saberes e as práticas das medicinas ancestrais e tradicionais locais. “Compreendendo que as comunidades quilombolas têm 450 anos, e o SUS tem 35, ou seja, ao longo de mais de 350 anos os territórios quilombolas tiveram apenas as medicinas tradicionais como única forma de cuidado. Isso é muito importante para os territórios, para a manutenção da memória, da ancestralidade. O SUS precisa mais do que nunca reconhecer e fortalecer isso”, cobra.

Na mesma mesa do evento, Rachel Gouveia, professora da Graduação e da Pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), falou sobre a necessidade de se combater o racismo estrutural no SUS. “O que vemos, na base, é que profissões relacionadas ao cuidado são sempre relegadas a mulheres pretas e periféricas”. Ela também compartilha do pensamento de Mateus. “Precisamos resgatar práticas e saberes que sofreram um apagamento a partir da medicina tradicional”.

Transformação digital da saúde

Depois de discutir o papel do SUS nos territórios e na promoção da equidade, o segundo dia do seminário voltou-se a outro desafio contemporâneo: a transformação digital na saúde.

Como não abandonar o conceito ampliado de saúde ao pensar o digital? Como não deixar que o fascínio pela tecnologia e a necessidade de transformação não apague o cuidado presencial? Como não canibalizar a atenção humana na área da saúde?

Com essas indagações, Rogério Lannes, coordenador do Programa Radis Comunicação e Saúde, “provocou” os palestrantes da mesa de abertura do 2º dia do Seminário SUS 35 Anos, em São Paulo.

“Precisamos pensar uma transformação digital que reafirme os princípios da reforma sanitária do SUS, dentro dos quais certamente está o conceito ampliado de saúde”, respondeu Ana Estela Haddad, da Secretaria de Informação e Saúde Digital do Ministério da Saúde.

Luiz Vianna Sobrinho, doutor em Bioética e Saúde Coletiva da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), relembra a previsão do empresário Bill Gates de que a Inteligência Artificial (IA) irá substituir os médicos até 2030. “Iremos deixar isso realmente acontecer? Como se dará a relação entre pacientes e profissionais de saúde? Uma coisa é ser substituído manualmente por forças mecânicas, como vemos desde a industrialização. Outra é ser substituído por tecnologias cognitivas”, reflete.

Segundo ele, os primeiros impactos na saúde já aparecem, com perda de cognição e de habilidade crítica dos médicos e profissionais da área de saúde com o uso de tecnologias de inteligência artificial. “Tenho relatos de colegas que estão assustadíssimos com o comportamento de jovens profissionais já totalmente amparados ou dependentes do suporte dessas tecnologias. Minha preocupação é o que será do futuro. O que teremos de relação humana?”, questiona.

Gonzalo Vecina, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), e Jairnilson Paim, sanitarista e professor da UFBA, participaram da conferência de encerramento do evento (19/9). Ambos analisaram o cenário atual do SUS. 

“Temos um enorme desafio em relação ao acesso. Quanto tempo demora para se diagnosticar um câncer? Quanto tempo leva para tratar? Quanto tempo leva para fazer uma cirurgia ortopédica de grande porte? Geralmente demora muito e a gente não tem o menor controle sobre isso”, criticou Gonzalo.

Para ele, o sistema de transplantes do país é um exemplo a ser seguido. “95% dos transplantes no Brasil são realizados pelo SUS, apesar de 25% dos brasileiros terem planos privados de saúde. Um exemplo na organização da fila de necessidade, baseada em duas premissas: gravidade e ordem de inscrição”.

Jairnilson aprofundou ainda mais a questão. “O maior desafio do SUS é político. É poder enfrentar as desigualdades. É poder enfrentar a relação público-privada. É preciso ter ampliação de suas bases sociais e políticas”, avaliou.

O debate completo dessas e de outras mesas do seminário pode ser assistido no canal https://www.youtube.com/outraspalavrastv. Radis também trará, em sua edição de dezembro de 2025, um especial sobre os 35 anos do SUS. Acompanhe pelo nosso site!

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