Psicóloga, psicanalista, filósofa e escritora, a capixaba Viviane Mosé se sente à vontade para falar sobre saúde mental, não somente por sua formação, mas pelas inquietações e reflexões que a levaram a questionar modelos de raciocínio e verdades absolutas. “Não existem doenças psíquicas, existem diferenças psíquicas”, disparou ao primeiro momento da entrevista que concedeu à Radis, durante o 8º Congresso Brasileiro de Saúde Mental, antes de lotar uma das sessões mais disputadas do encontro, que aconteceu no fim de julho na cidade de São Paulo.
Na conversa, ela apresentou um mundo em transição, descrevendo metaforicamente dois movimentos: um prédio que nasce, representando a libertação dos corpos em contraponto à normatividade da razão, e um prédio que cai, constituído pela dificuldade humana em lidar com o sofrimento da certeza de sua própria finitude. Neste cenário, criticou a medicalização excessiva da tristeza e destacou a potência da arte e da complexidade dos corpos como antídotos à loucura. “O sofrimento faz parte da vida e tem que ser tratado com arte”.
“A vida é o que a gente inventa”
“A negação da arte nos hospitaliza”, advertiu Viviane, que defendeu a construção de um novo modelo de saúde, que inclua o delírio, o erro e a fantasia, e destacou o quanto são potentes as vivências da diversidade. Corpos livres, diferentes e potentes contra o controle dos psicofármacos; vidas em diversidade, conectadas pelo uso consciente de instrumentos de comunicação e de construção do conhecimento. “A vida é o que a gente inventa”, propôs a filósofa, vislumbrando um novo ser humano, mais consciente das complexidades de seu corpo e da mente, mais integrado à sociedade e suas complexidades.
“Não existem doenças psíquicas, existem diferenças psíquicas”
De que modo a saúde mental se relaciona com o seu trabalho?
A saúde, especialmente a saúde mental, é meu tema de trabalho a vida inteira. Com 17 anos eu já estava na faculdade de Psicologia, e a minha carreira veio daí. A Filosofia entrou na minha vida como um complemento. E todo o meu trabalho de Filosofia diz respeito ao humano. Minha palestra de hoje é por um ser humano mais amplo. Daí eu discuto o modelo psíquico que nos é imposto e a nossa subjetividade, que é um modelo. A minha questão fundamental não é curar doenças, mas produzir saúde. É a produção de saúde, não a cura de doenças. Não existem doenças psíquicas, existem diferenças psíquicas, e algumas doem muito, mais do que outras diferenças. Esse é meu trabalho a vida inteira. Por isso estou aqui.
Na apresentação do congresso, um texto destaca o lirismo de Manoel Bandeira, quando diz: “Quero antes o lirismo dos loucos / o lirismo dos bêbados / o lirismo difícil e pungente dos bêbados / O lirismo dos clowns de Shakespeare / Não quero mais saber do lirismo que não é libertação”. Neste momento em que se busca ou se defende a racionalidade tecnológica, como usar o lirismo para promover a saúde mental?
Eu não concordo que haja uma busca pela racionalidade. Ninguém está buscando racionalidade e não há racionalidade. Nós vivemos hoje a queda drástica da razão. A razão é um modelo de raciocínio que nasceu no pensamento platônico-socrático, mas que se estrutura na modernidade com o pensamento cartesiano. E o pensamento cartesiano, segundo Michel Foucault, é o início da exclusão dos loucos. Como é que começa essa exclusão? Quando eu digo “penso, logo existo”. Mas eu não existo porque penso; eu existo porque eu sinto. Então a ideia cartesiana de “eu existo porque eu penso”, que marca o início da modernidade, nos diz que não é que eu existo porque eu penso; ela nos diz que eu existo porque eu penso do modo cartesiano. Então quem não pensa do modo cartesiano está no lugar da (des)razão. É aí que a história da loucura começa.
Quais os reflexos disso para a vida?
O que nós temos no mundo é um modelo psíquico que foi inventado e que funciona a partir de um raciocínio em linha, que estabelece que de um lado está o bem e do outro, o mal. Isso não é real. Todo mundo sabe que existem bem e mal, mas ninguém sabe a diferença, onde se encontram um e outro. Ninguém sabe a diferença entre sanidade e loucura, porque a razão (o modelo racional de raciocínio) é um dos maiores produtores de violência e de sofrimento psíquico. Este modelo racional e cartesiano está em franco desabamento. Hoje nós vivemos o caos da queda da estrutura civilizatória; vivemos a urgência e a necessidade da queda dessa estrutura, e ela cai muito em função das novas mídias, quando saímos de um modelo vertical de gestão para um horizontal. Neste novo modelo também há espaço para a defesa da Terra plana e para a crença de que a vacina não presta, mas isso é bolha, é consequência da liberdade do pensamento que veio com a internet. Hoje vivemos um caos porque tínhamos um modelo pronto de verdades, que eram excludentes, e elas caíram. Ainda bem! Mas ainda não temos uma nova possibilidade. Eu leio esse novo momento como a queda do modelo lógico-racional como predomínio e o nascimento de outros modos de pensar. Isso traz outros seres. E o que é esse novo modo de pensar? É o modo de pensar que inclui o delírio. Não existe um ser humano sem delírio. Todos deliramos, todos imaginamos. Nós todos somos líricos. A vida é o que a gente inventa. Então quando a gente separa a loucura da razão e a chama de (des)razão, nós estamos dizendo que a razão é um pensamento sem loucura e que a loucura não tem razão. Isso não é verdade. A loucura tem a sua razão. Ela tem seu modo de organização. Assim como a razão também tem loucura e delírio. A gente tem que inventar um modelo psíquico que inclua a fantasia e o delírio na nossa vida, que inclua o erro. Temos que ampliar o modelo psíquico não para nos tornarmos melhores como seres humanos, mas para nos tornarmos maiores. Tornando-nos maiores nós incluímos. Na Idade Média, por exemplo, as pessoas deliravam, viam santos e ninguém as chamava de malucas. Havia um delírio incluído. É claro que na Idade Média também havia pessoas que divergiam. Sempre há quem diverge do modelo e sai na ponta. Mas o importante é perceber que essas pessoas não eram chamadas de doentes. Essa é a questão. Existem diferenças psíquicas; existem pessoas que não conseguem entrar na nossa ordem. E isso não é uma doença.
“Ao chamar o seu sofrimento de doença, você fica sob o domínio de quem lhe cura. E quem lhe cura não é um terapeuta, é a medicação psiquiátrica, que cria dependência”
Mas as políticas públicas e o mercado não tentam estruturar isso de outro modo? Não há um conflito aí?
Quando eu falo isso é porque eu estou fazendo um complô em favor disso. Eu estou aqui para dizer: “Tudo caiu!” Mas é obvio que o mercado vai levar isso por um outro caminho, para uma nova ordem, que é castradora. Mas esse é o melhor momento para a gente, entende? Apesar de todo o sofrimento que ele traz, nós podemos entubar uma nova possibilidade, porque não tem ninguém coordenando esse troço. O mercado virou um salve-se quem puder. É terrível, é cruel. Quem manda hoje no lucro capitalista, basicamente? A indústria farmacêutica! Você fecha uma loja, um restaurante ou um centro cultural e ali abre uma farmácia de quatro quarteirões. É algo inacreditável. A farmacologia, especialmente a psicofarmacologia, aparece como saída para todo mundo que sofre! Mas o sofrimento é parte da vida, e ele tem que ser tratado com arte. Quando a Organização Mundial da Saúde diz que no século 21, se não fosse a pandemia, a doença mais incapacitante do mundo seria a depressão, é porque está se considerando depressão uma diferença individual que diz respeito ao sofrimento. Hoje, sofrer é ter depressão. Peraí! Então todo mundo que sofre tem depressão? O que é isso? Tornaram-nos deprimidos e a indústria farmacêutica — que não investe em pesquisa e cobra caríssimo pelos seus medicamentos — gasta seus milhões em mídia. Só que mídia de medicação produz doença. Então hoje existe uma produção de depressão para controle social. Passamos a ser controlados por medicações psiquiátricas, e elas são muito competentes. Até a mãe que está amamentando uma criança, cansada, faz um Tik Tok reverenciado o uso de remédios como Rivotril ou Frontal. O que é isso? Então para se ter um filho tem que tomar Frontal? Rivotril, três gotinhas. Isso é moda no Tik Tok: todo mundo que está sofrendo tem que tomar umas gotinhas. Isso também é a destruição da humanidade e é muito grave. Nós não somos deprimidos, estamos sofrendo. É preciso parar de chamar de depressão o sofrimento. Porque ao chamar o seu sofrimento de doença você fica sob o domínio de quem lhe cura. E quem lhe cura não é um terapeuta, é a medicação psiquiátrica, que te cria dependência. Hoje a gente tem uma revolução na psicofarmacologia, com medicamentos incríveis, não é isso? Então por que nunca tivemos tantos deprimidos, suicidas e automutiladores? A medicação psiquiátrica está aumentando o número dessa gente. Então o ser humano tem que resgatar a sua existencialidade e o seu sofrimento para se libertar desse controle social, feito por quem mais lucra no mundo, que é a indústria farmacêutica.
“A negação da arte nos hospitaliza”
O tema do congresso destaca as antropofagias e as potências da luta antimanicomial. Você apresenta este momento como caótico, mas também muito potente. 100 anos depois da Semana de Arte Moderna, quais são as lições que a antropofagia pode dar para enfrentar esse momento e fortalecer o complô que você propõe?
O que a Semana de Arte Moderna trouxe ao Brasil foi a sua dignidade estética como o povo da diferença. Isso é alucinante! A gente tinha vergonha de existir. E a Semana de Arte Moderna disse: Nós somos incríveis, com toda essa loucura que existe nesse país, com essa mistura de todas as coisas. A Semana de Arte Moderna deu dignidade à cultura popular, colocando-a nos museus; ela trouxe o Brasil para a nossa mão. Então o que é que a gente tira dessa experiência? Que a arte dignifica a nossa existência. Há 100 mil anos, apenas, nascia a nossa espécie, que é a Sapiens sapiens. Ela nasce quando adquire consciência de si, quando começa a enterrar os mortos. Ali você já vê que há consciência. O que é a nossa dor humana? É a dor de existir. É saber que se nasce e que se morre. É terrível descobrir isso, desde criança, quando se entende que há um fim. O que faz com que a gente não enlouqueça, no pior sentido? É a arte! Então você se descobre mortal, mas você se descobre criador. A arte não pertence aos artistas. A arte pertence a todos nós. É isso que a Semana de Arte Moderna nos ensina. Que nós somos artistas quando compomos a nossa casa, especialmente no Brasil. Eu conheço o Brasil como a palma da minha mão. Quando você chega ao Nordeste, que é nossa área mais pobre, quando você chega a uma favela, assim como quando você chega ao continente africano, o que você encontra? Arte brotando por todos os lados. A África é o continente mais pobre do mundo, mas a música do mundo nasceu na África. A negação da arte nos hospitaliza. Então se a gente quer falar de luta antimanicomial, a gente tem que falar de uma sociedade que ama e cultiva a arte e a cultura.
Neste cenário de resgate das potências da luta antimanicomial, qual é o papel da comunicação?
A comunicação é o que domina nosso mundo. A terceira guerra mundial não é o coronavírus. É a guerra da informação. Nós vivemos uma guerra diária pela informação. Quantas pessoas morreram porque não tomaram a vacina? A gente tem que ter raiva delas porque eram negacionistas? Não, eram apenas pessoas que foram influenciadas por notícias erradas. Elas acreditaram na cloroquina, ou que dentro da vacina havia um chip que iria transformar as pessoas em jacarés. De onde vem o controle de corpos hoje, que nos diminui tanto? Vem da informação, do conhecimento e da comunicação. A gente só vai conseguir resgatar os ideais da Semana de Arte Moderna e do Movimento Antimanicomial, que é um movimento libertador, se resgatar os ideais desse movimento que realmente entrou com tudo. Como é que a gente faz isso? Compreendendo que nós somos dominados pelo conhecimento e pela informação.
Que movimentos, hoje, você identifica como contrapontos a esse aprisionamento e a esse controle de corpos e mentes?
Eu sinto que a grande abertura psíquica que vivemos ainda não é proporcionada pela arte. Até porque a gente viveu essa pandemia e o isolamento atrapalha muito o processo artístico. O que vejo claramente como algo que rompe, hoje, e que é interessante para se pensar no debate sobre saúde mental, é a transexualidade e a diversidade de gênero. A possibilidade de corpos livres, que se combinam em masculino e feminino como bem entendem. A gente já mexe no corpo há muitos anos, faz plástica, faz cirurgias, mas isso pode, né? Então porque não posso colocar peito, retirar peito e mudar? As pessoas hoje, na transexualidade, estão criando um movimento que não é somente relacionado ao corpo. É algo que se relaciona com um novo ser humano. Vou falar de outra maneira. Quando fiz Psicologia, na Universidade Federal do Espírito Santo, uma excelente universidade, a gente já sabia que a homossexualidade não era doença. Ninguém nem discutia isso. Mas a gente tratava a transexualidade como um desvio grave de papel. Hoje, a gente sabe que isso não é verdade. A gente sabe que pessoas não são masculinas ou femininas. A oposição entre masculino e feminino existe em consequência da oposição entre bem e mal, que caiu. Então quando cai a oposição entre bem e mal, saúde e doença, cai também o modelo psíquico básico que diz que mulher é uma coisa, homem uma oposta e que no meio está tudo errado. Isso não é verdade. Homem tem muito de mulher e mulher tem muito de homem. E não deixam de ser mulher ou homem. Pessoas que se colocam na transição de gênero estão abrindo uma possibilidade humana muito grande. Grande parte das hospitalizações feitas no século 20 tinham relação com a diversidade de gênero, porque se aceitava que um homem se colocasse como mulher, mas não se aceitava que uma mulher que se colocasse metade dela mulher e a outra metade, homem. Isso não podia, era um desvio grave. Hoje, você anda na rua e vê um cara de barba, batom vermelho e brinco. E o que você tem com isso, se é assim que ele se sente? O mundo está rompendo, de um modo inacreditável, para a liberdade da diferença. Isso é uma coisa legal, é bom, algo que eu chamo de “prédio que nasce”. Mas há também “o prédio que cai”, ao mesmo tempo. E o que cai é aquele que pega a nossa depressão e a medica.
De que modo isso acontece?
Nós estamos entre dois movimentos: Um deles é o movimento de libertação do corpo, do pensamento, por um ser humano maior, onde os gordos podem viver felizes, os velhos podem transar e viver, as pessoas que têm limites físicos podem ser felizes. Hoje tudo está mudando. Se você não tem uma perna, se você só tem o tronco, você se maquia toda, aparece e se casa! Então hoje não importa se você não tem perna, não tem braço, se tem vitiligo. Tudo isso é colocado como bonito. A sociedade em rede está acabando com muitas exclusões — e que geram internações. Então jovens que tem uma diversidade de gênero grande, pessoas muito gordas ou muito magras, muito bonitas ou muito feias, tudo isso era um inferno, e hoje não há mais isso. Assumimos os obesos. Se é uma questão de saúde, isso é problema deles, mas eles existem. Isso é legal, é o prédio que nasce.
E o prédio que cai…
O prédio que cai é representado por todos nós, que não sabemos lidar com o sofrimento e estamos à mercê da indústria. A indústria nos capta por meio da medicação psiquiátrica. A Inteligência Artificial é a nova revolução que vai acontecer no mundo. E ela vai se ocupar do que? Da sua decisão. Quando você é deprimido e medicado, é mais fácil você comprar um produto de Inteligência Artificial. Existe um complô, que não é organizado por uma pessoa, e não é uma teoria da conspiração, mas o mercado, há muitos anos, nos adoece para nos tratar depois. Diz o Michel Foucault: No controle social, no controle do poder, descobriu-se que é mais barato criar um fraco do que punir um forte. O poder repressivo pega você, que é forte, te tortura e te manda para a cadeia. E o poder disciplinar cria você fraco. Somos uma sociedade de produção de fraqueza. Fraqueza que depois será dominada pela medicação.
Como reagir a isso?
O outro caminho é: sejamos gordos, sejamos velhos, sejamos sem perna, sejamos transexuais, sejamos o que quisermos. Isso é o novo ser humano. E isso é produção de saúde. Eu existo no mundo e eu tenho direito a existir. É uma trajetória entre o meu nascimento e a minha morte, que eu traço como eu quero. Se eu não estiver machucando ninguém, se eu seguir respeitando os outros, por que eu não posso ser como quero?
Entendendo sua fala como uma injeção de potência na luta por uma nova ideia de Saúde, qual a contribuição da Filosofia à formação de novos profissionais?
A Filosofia tem total contribuição. Eu discuto muito com meu filho sobre estas possibilidades. Ele tem 18 anos e vê o mundo a partir de sua destruição. Ele me fala: “Mãe, não tem jeito. Olha o meio ambiente, isso e aquilo não têm jeito”. Eu digo a ele: “Olhe só, nós não temos uma sociedade em rede? Temos! Não nos comunicamos, todos, com o mundo inteiro, mesmo com todas as diferenças, inclusive com quem não acredita em vacina, inclusive com quem acredita em Terra plana?” Ele responde: “É, mãe”. Há uma mudança conceitual nesta rede. Em cinco anos temos outro mundo. Nós temos tecnologia para resolvermos os problemas em nossos mares, para clonar animais e plantas, para resolver a vida neste planeta, sim nós temos. O que não temos é vontade política. Uma mudança conceitual de pensamento muda o mundo, certo? Profissionais de saúde hoje continuam trabalhando no sufoco, assim como os professores. Neste momento, não somos mais consumidores, nós somos o produto. Robôs brigam para que nossas cabeças se transformem em consumidoras. É um troço terrível! Neste contexto, quando os profissionais de saúde entendem essa interpretação eles se potencializam. Porque o que potencializa um profissional de saúde é ele entender o que é o jogo, porque senão, como humano, ele submerge no mesmo buraco, achando que não tem saída, que é um retrocesso.
Como lidar com a ideia de retrocesso?
Retrocesso só existe para quem acredita em progresso. Progresso é uma ideia ridícula, que diz que a gente vai do menos para o mais desenvolvido. Mas o mundo caminha para frente, para trás, de lado, de banda, não existe uma linha. Então, e daí se estamos em retrocesso? Um retrocesso pode significar um respiro para um avanço imenso, posterior. O mundo não caminha somente para frente, então retrocesso não é um problema. Estar em retrocesso pode ser bom para a gente sentir na carne a importância da liberdade, para entender como se vota… Então tudo isso não é o problema. A questão é entender que quando a gente sofre um abismo como o que a gente vive agora, a hora é de se potencializar para dar um maior salto. E quem é que vai dar este salto? O profissional de saúde e o profissional da educação, basicamente. Antes, era mais o da educação; hoje é mais o da saúde porque a doença psíquica domina o planeta. Antigamente o professor era o profissional mais valorizado — e eu falo isso direto para eles. Agora, é a hora da Saúde, infelizmente, porque o analfabetismo, que era nosso grande problema, ainda existe, mas hoje é o suicídio de jovens que é a segunda causa de mortes entre jovens e a primeira entre crianças, em muitas partes do mundo. Em muitas cidades americanas, é a primeira causa de morte entre crianças, superando inclusive em número os acidentes.
Historicamente, qual o papel de uma pandemia neste cenário que você descreve? Ela acelera, ela faz parte, ela não impacta… Qual é a sua avaliação deste momento que a gente ainda vive?
A gente só sabe o que acontece com a gente depois. Nós ainda estamos em uma pandemia, mesmo que não usemos mais máscaras. Só que a gente viveu, durante dois anos, assistindo a covas coletivas sendo furadas para enterrar pessoas. Então o que nós sofremos, isolados dentro de casa, com medo de respirar o ar que podia nos matar, foi desesperador. Isso inevitavelmente muda as pessoas. Mas elas não mudam racionalmente. “Ah, ninguém mudou”, podem pensar. Não mudou racionalmente. Eu vi uma matéria esta semana dando conta de que existe na Europa um acúmulo de produtos. As pessoas não estão comprando. O mercado imaginou que as pessoas, saindo de uma pandemia, iriam surtar. Ninguém sabe o que fazer. As pessoas hoje não compram produtos, elas compram virtualidades. E mais outra coisa. O mercado está mudando. Nós vamos trabalhar quatro dias na semana. Isso já está acontecendo no mundo todo. E o que é que se vai fazer nesse terceiro dia? Arte e cultura! E por que isso? Porque as empresas de tecnologias estão vendo o suicídio de seus líderes, no mundo todo. Em Franca, São Paulo, já existem algumas empresas que não trabalham às quartas-feiras. O que eles descobriram: que a lucratividade melhora. Estamos em um mundo de mudanças!
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