Alessandra Korap é filha dos igarapés. Como uma mulher-peixe, ela cresceu nas águas que cortam a Reserva Praia do Índio e alimentam o curso médio do Rio Tapajós, na altura do município de Itaituba, no Sudoeste do Pará. Seus filhos e parentes também nasceram ali e se banharam no mesmo rio e nos mesmos igarapés, assim como seus antepassados. São águas que carregam memórias. Indígena do povo Munduruku e mãe de dois filhos, ela narra que viu a chegada de garimpeiros, madeireiros e grandes empreendimentos como portos graneleiros — “as dragas mexem no fundo da água” e arrastam sujeira e lama para dentro dos territórios indígenas. “Todos esses empreendimentos estão deixando a água suja, matando os nossos peixes, contaminando os rios e trazendo pessoas para invadir cada vez mais as terras com olhar de ambição”, alerta.
Para o discurso oficial, tudo aquilo ganha o nome de avanço do progresso; mas, para os povos indígenas, são sinais de devastação. Alessandra conta que os invasores chegam como se aquela fosse “uma terra sem lei” — ocupam territórios indígenas ou reservas para atividade de garimpo ou extração ilegal de madeira. “A Amazônia não é mais aquela floresta toda limpa e bonita”. As águas que as comunidades utilizam para beber e se banhar, e da qual extraem uma de suas principais fontes de alimento, os peixes, são contaminadas pelo mercúrio utilizado no garimpo. Em 2020, um estudo da Fiocruz com indígenas do povo Munduruku, no Médio Tapajós, em parceria com a organização WWF-Brasil, indicou que todos os participantes da pesquisa estavam de alguma maneira afetados pelo contaminante — de cada dez, seis apresentaram níveis de mercúrio acima do seguro. “A Amazônia pede socorro. Não é só a gente que tem que defender. O mundo todo tem que saber o que está acontecendo”, aponta.
A bacia do Rio Tapajós também é ameaçada por grandes obras que afetam a vida das comunidades de seu entorno, como indígenas, quilombolas e ribeirinhos. O projeto do Complexo Hidrelétrico do Tapajós previa a construção de cinco usinas hidrelétricas, mas as obras receberam críticas pelos impactos sociais e ambientais, como inundações de áreas de floresta, perda de fauna e flora e destituição das terras de mais de 30 comunidades tradicionais — que tiveram um papel decisivo para que o projeto não fosse implementado. Esses mesmos impactos foram sentidos pelas comunidades no entorno da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na bacia do Rio Xingu, próximo a Altamira, no norte do Pará: as populações viram uma área de 478 km quadrados ser inundada, foram deslocadas das terras em que viviam e presenciaram o aumento da violência, da pobreza e da fome. “Quando se fala que vai haver um empreendimento ou uma usina hidrelétrica, quem está interessado? Quais são as máquinas que vão entrar? As pessoas que vêm junto trazem mais violência, drogas e ambição na mala”, descreve Alessandra. A construção de portos graneleiros e ferrovias, para escoar a produção de soja, é outro tipo de empreendimento que ameaça os territórios preservados.
Alessandra transformou a sua trajetória de vida em um clamor amazônico em defesa da Mãe Terra. Ela foi a primeira mulher a presidir a Associação Indígena Pariri Munduruku, da qual hoje é vice-presidente. Aprendeu a falar alto com políticos em Brasília, como no episódio que viralizou nas redes sociais, em 2019, em que bateu várias vezes na mesa diante do então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para denunciar o descaso com as demarcações de terras indígenas no governo Bolsonaro; sentou para conversar e decidir junto com os caciques; enfrentou balas de borracha e spray de pimenta, em manifestações dispersas com violência pela polícia, como aconteceu em junho de 2021, no Levante pela Terra; e, por fim, decidiu estudar Direito na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), em Santarém, para conhecer os direitos de seu povo. “As pessoas não querem que a gente descubra quais são os nossos direitos. Só que não podemos nos calar”, ressalta.
Em 2020, Alessandra recebeu o Prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos por sua atuação como ativista em defesa dos direitos indígenas e pela preservação ambiental. Ela afirma que os povos originários são os verdadeiros guardiões da floresta. Contudo, crescem os casos de ataques, intimidações e perseguições contra as lideranças, como ocorreu com Maria Leusa, outra liderança do povo Munduruku no Pará, que teve a sua casa incendiada, em maio de 2021, na aldeia em Jacareacanga. “Todo dia que a gente acorda e vê que ainda estamos vivos, a gente sabe que tem que continuar em mais um dia de luta”, resume Alessandra.
[Leia a entrevista completa com Alessandra Korap Munduruku, que é parte da nossa reportagem da capa da edição de agosto]
Os povos indígenas fizeram uma mobilização histórica, com o Levante pela Terra, em junho, contra o PL 490 e toda a discussão sobre o Marco Temporal. Que balanço você faz dessa mobilização?
Foi uma mobilização positiva diante de tudo o que está acontecendo nos territórios, como invasões, muitas mortes por causa da covid e o próprio Congresso decidindo coisas sem nos consultar, sem perguntar aos povos indígenas. O Levante pela Terra foi o grito de resistência de mais de 521 anos, mostrando que a gente não parou e não se extinguiu. É o que eles querem, ao nos calar e nos silenciar. Serviu para mostrar que ainda estamos firmes nessa luta, mesmo com as perdas de famílias por causa da covid e das invasões. Esse chamado veio para fortalecer cada vez mais as bases. Até para chegar em Brasília, tentaram parar os caciques, furaram os pneus e tentaram queimar o ônibus. Mesmo assim os caciques disseram: “A gente quer ir para Brasília”. E conseguiram chegar, conversaram com o ministro [Luís Roberto] Barroso [do Supremo Tribunal Federal], mesmo que não presencial, numa conversa virtual. Foi uma vitória ele ouvir também outras demandas, não só do povo Munduruku, mas de outros povos que estavam presentes, Tupinambá, Pataxó, Guarani, Xokleng, Caiapó. Todos os povos estavam reunidos. A gente fala que foi uma conexão da natureza chamando a gente, para a gente se reunir e falar quais os perigos que estamos sofrendo.
Você já disse que “a Amazônia está doente”. Quem são os responsáveis por essa “doença”? Que interesses estão em jogo e colocam tanto os povos indígenas quanto a própria Amazônia em risco?
O culpado mesmo são os invasores que estão chegando de outros lugares: chegam aqui como se fosse uma terra sem lei, sem perguntar se é terra indígena, parque ou reserva. O garimpeiro, o madeireiro, os grandes empreendimentos como as usinas hidrelétricas — a Usina Hidrelétrica (UHE) de Teles Pires, São Manoel, SINOP, Colíder, Belo Monte. Todos esses empreendimentos estão deixando a água suja, estão matando os nossos peixes, estão contaminando os rios, estão trazendo as pessoas para invadir cada vez mais as terras com olhar de ambição. A Amazônia não é mais aquela floresta toda limpa e bonita. A água suja passa por dentro do território. As dragas mexem no fundo da água e [a sujeira] vai para dentro das aldeias e dos territórios. A mesma água suja passa na frente das aldeias e das grandes cidades. Quando a gente anda dentro da mata, vê onde eram as nascentes. Está só lama. Os igarapés estão só lama. Outro problema é a derrubada de madeira dentro da floresta. A gente vê pistas de pouso dentro do território e da floresta. A Amazônia pede socorro. Não é só a gente que tem que defender. O mundo todo tem que saber o que está acontecendo.
O Congresso colocou em discussão tanto o Projeto de Lei (PL) 490 — que altera as demarcações de terras indígenas — quanto o PL 2.633/2020, conhecido como “PL da grilagem”, que facilita ocupações em terras da União. Como essas medidas ampliam a disputa por terra e afetam os povos indígenas?
Eles aprovam o que querem aprovar e incentivam os invasores a entrar cada vez mais dentro dos territórios indígenas. De 2019 pra cá, a situação vem piorando cada vez mais. Está certo que governo nenhum quer ouvir, mas esse homem não ouve ninguém, ele é o próprio genocida. As invasões estão aumentando. Esses PLs são para tirar o sonho de muitos povos que querem ver as suas terras demarcadas. O próprio Supremo pode tirar esse sonho de vários povos que viviam aqui. Pessoas que vêm de São Paulo e do Rio Grande do Sul dizem que já moravam aqui. Que eu saiba eles nunca moraram aqui. Na Amazônia, no Rio Tapajós, no Rio Xingu, quem estavam eram os povos indígenas. A gente tem muita história para contar. Todos esses projetos que estão sendo aprovados são culpa dessas pessoas. A Amazônia não pede socorro só para nós. Mas a sociedade tem que saber quem está colocando no Congresso. As pessoas votam em determinados candidatos achando que vão fazer a cidade crescer. Olha o impacto que está trazendo para a gente — esses PLs querendo expulsar os indígenas do território. O Marco Temporal vem dizer que nós somos índios apenas no dia 5 de outubro de 1988. Querem apagar a nossa história, querem apagar a memória do Brasil. Quem é o culpado disso tudo? Só que não morrem apenas os povos indígenas. Vão morrer pessoas na cidade. Famílias estão passando fome na cidade, estão morrendo animais. A soja também precisa de chuva. Ninguém planta se não tiver água. Não é só nós que vamos desaparecer. Vamos todos desaparecer juntos.
Como a presença do garimpo, da mineração e de grandes empreendimentos, como portos e hidrelétricas, tem impactado o cotidiano dos povos indígenas no Pará?
Primeiro, quando se fala que vai haver um empreendimento ou uma usina hidrelétrica: Quem está interessado? Quais são as máquinas que vão entrar? De onde vem essas pessoas? As pessoas que vêm junto trazem mais violência, drogas e ambição na mala. Quando chegam aqui, eles têm máquinas enormes. Botam a placa de “área particular” como se nós não estivéssemos aqui antes. Todos esses impactos é o homem branco que está trazendo. Mas a gente mostra o outro lado. A gente sabe que não vai conseguir combater uma máquina enorme, nem as drogas e armas pesadas que estão vindo. Esse papel quem deveria fazer era a Polícia Militar ou a Polícia Federal, mas não estão conseguindo fazer. Imagine nós, para combater esses grandes invasores que estão chegando! Quem vai combater os aviões clandestinos? Helicópteros? Os caras que estão com carrão e helicóptero. Se a própria Polícia Federal não está conseguindo fazer a sua fiscalização, imagine nós, que a única arma que nós temos é a língua, a dança, a cultura. Agora estamos usando outro tipo de arma também, que é o audiovisual. As meninas fazem a sua própria história, a própria história do seu povo. Muitas vezes o que sai na mídia não é o que a gente queria mostrar. Estamos usando as redes sociais para mostrar o que realmente está acontecendo, porque não queremos morrer silenciados. Queremos mostrar coisas boas também: que uma decisão, por exemplo, não é tomada apenas por uma associação ou pelo cacique, e sim pelo povo, com a participação de mulheres, pajés, crianças, guerreiros, guerreiras e caciques. É uma decisão coletiva. A gente está usando outros meios. As invasões estão crescendo. Olha o que aconteceu com a aldeia da Maria Leusa [que teve a casa incendiada em maio], grande liderança que vem fazendo as denúncias há muito tempo. Quem for contra o garimpo eles tentam matar. A gente tem que andar fugido para continuar vivo? Quem são os interessados que querem tirar o ouro? Quem são essas pessoas?
Qual é o papel das mulheres indígenas na luta pela preservação ambiental e pelos direitos dos povos originários?
O papel da mulher é muito importante. Os próprios caciques falam que as mulheres têm coragem, que elas não recuam. De repente a gente está não na frente dos caciques, mas sim de braços dados com eles. Eles não estão sozinhos, pois nós mulheres estamos com eles. As vozes das mulheres indígenas estão indo mais longe, como da Sonia Guajajara, da O-é Kayapó, da Maria Leusa [Munduruku] — e eu também sou uma delas. Eu digo: Que alegria fazer parte desse grupo, incentivando outras mulheres a ter coragem. A gente vê as próprias crianças dizendo: ‘Quero ser igual a você, quero falar igual a você’. É um motivo de alegria trazer essas vozes; e as crianças estão tendo inspiração em nós. Eu penso: ‘Nossa, que orgulho’. Não foi fácil passar pelos caciques por ser mulher. Teve a barreira sim, mas a gente teve que mostrar aos poucos e ir conquistando nosso espaço. E hoje os caciques mais velhos respeitam muito a gente, querem saber o que a gente está pensando, o que nós achamos. Quando eles estão decidindo algo, eles perguntam se vai ser bom. Essa liberdade e autonomia nas decisões são muito importantes. Muitas vezes tenho medo de decidir errado. Mas sempre tentamos decidir juntos, pensamos se ninguém vai sofrer, se os nossos parentes estão firmes. É uma decisão coletiva. Quando a gente tem dúvida, a gente passa um ou dois dias só discutindo o mesmo assunto. As vozes das mulheres não falam só para fora. Tem outras mulheres do coletivo que muitas vezes não aparecem, mas elas são os braços da gente. As mãos delas estão segurando a gente para irmos mais longe e falarmos mais alto, junto com as crianças, os caciques.
São inúmeras as notícias de ataques de garimpeiros a lideranças indígenas em território munduruku — em maio, a liderança indígena Maria Leusa teve a casa incendiada e precisou deixar a Aldeia Fazenda Tapajós, em Jacareacanga (PA). Como as lideranças têm lidado com essa questão de ataques e ameaças?
O único jeito é a denúncia. Até hoje não foram pegos os bandidos que fizeram. Estão soltos em uma cidade sem lei. Tudo está no papel, mas na realidade não aconteceu nada. O Supremo fez uma decisão favorável ao povo Munduruku e Yanomami, mas o Ministério da Justiça não acatou, porque eles falaram que estão todos aqui. Eles acham que aqui tem Polícia Militar e Força Nacional. Mas não é verdade. Os caciques estão vendo. Eles ligam para mim e dizem: não tem nenhuma polícia aqui.
Os povos indígenas denunciam a falta de escuta em decisões sobre grandes obras e mineração que vão afetar as suas terras, como foi o caso de Belo Monte. Qual é a importância do movimento construído pelos povos em favor do direito a serem consultados?
O protocolo de consulta foi construído porque havia pessoas sendo aliciadas pelo empreendimento no Rio Tapajós, que era a usina. As pessoas estavam traduzindo o que ia ser falado nas aldeias, para enganar os caciques, dizendo que ia ser bom, que todo mundo ia ter carro, ter alguma coisa dentro da aldeia. Então decidiram junto com os caciques que não era desse jeito, não era negociar com algumas pessoas que iam pegar uma parte, mas era a decisão de todo o povo que não estava sendo respeitada conforme a Convenção 169 e a Constituição. O maior parceiro nessa época foi o Ministério Público Federal, que explicou quais eram os nossos direitos. O protocolo de consulta foi construído com o próprio povo, falando que o governo que quer realmente fazer uma consulta deve ser feito desse jeito: que não seja em tempo de roça, que não venham enganar, que não podem escolher o tradutor, que não podem filmar (porque quem filma é o povo). E não é uma decisão para ser tomada em um ou dois dias, tem que ser no tempo que o povo julgar necessário. E não é uma consulta só com os caciques e sim com o povo. E esse governo que realmente quer fazer a consulta que não venha com mentiras, que não venha com a Polícia Federal, que não venha com Força Nacional. Que eles venham com boa vontade e expliquem certinho com um tradutor escolhido pelo povo para traduzir. Se o povo disser não, o povo tem o direito à decisão final.
Durante o Levante pela Terra, quando as mulheres indígenas distribuíram flores para os policiais, a Abip publicou uma fala muito marcante: “Somos um movimento de cura para uma sociedade doente”. O que os povos originários podem nos ensinar sobre a relação com a Mãe Terra?
Primeiro, é preciso ter uma conexão. Não é só olhar e dizer: que bonito! Existe vida dentro do rio. Tem os locais sagrados. A gente se cura através da natureza. Essa violência que acontece é uma violência do Estado que a gente vem sofrendo. E a gente mostra o outro lado: a cura da natureza. A cura dos rios.
Como é a vida da Alessandra Korap ativista, mãe e liderança indígena?
Muito complicado! Ontem fui visitar uma amiga minha que foi ameaçada. Até falei para minha colega, uma advogada: Diz para minha mãe que estou num lugar seguro. No lugar “seguro” onde tem muitos madeireiros e mineradoras (risos). Nossa vida é luta e resistência. Eu sou mãe. Tenho que me preocupar com meus filhos e com a segurança deles. Estou tentando estudar e entender o lado do Direito que não é respeitado. A Constituição era para ser respeitada, mas infelizmente ela está sendo violada. Como a gente vai ensinar isso no mundo doentio dos brancos? Eu estou dentro da universidade para fazer ouvir o nosso lado. Muitos deles não entendem o que é direito. Eles acham que direito é só o que está no papel. Nós temos os nossos direitos: direito à água, a viver no território, direito a dizer não ou a dizer sim. A universidade ainda tem muito o que aprender com a gente. Não é só você sentar, ficar num quadrado e dizer: agora eu aprendi Direito. Mas você nem sentou com o povo, não sabe o que o povo está pensando, não sabe o que o rio está dizendo. Eu aprendo mais com o meu povo, com o movimento indígena, dentro das aldeias, do que dentro da universidade.
E seus filhos?
Meus filhos estão crescendo, estão querendo namorar e já estão querendo saber do movimento. Eles ficam muito preocupados comigo, querem saber como eu estou. Sempre viajo e estou arriscando a minha vida. A minha mãe fica preocupada. As pessoas não querem que a gente descubra quais são os nossos direitos. Quando a gente sabe o nosso direito, eles tentam nos silenciar. Só que não podemos nos calar. Todo dia a gente usa uma estratégia para continuar viva, para estar aqui, falando com você, falando no Congresso ou na universidade. Temos muito o que ensinar, mas também aprendemos muito. A gente chora, a gente ri, mas a gente é feliz, tendo o território para viver, tendo o rio para lavar roupa ou beber água. Muita gente não sabe o que a gente passa para chegar em Brasília. Muitas vezes não temos o que comer, não temos água. Vamos para um lugar frio. É agradecer muito às pessoas que deram esse apoio a quem estava lá em Brasília, no barraco de lona, chovendo, e as pessoas estavam sempre doando alimentação e cobertores. Foi muito bonita também essa conexão das pessoas não indígenas. Agradecemos muito às pessoas que têm bom coração. Mas muitas pessoas não entendem. Aliás, têm pessoas que precisam aprender a ouvir, porque muitas vezes elas não escutam. Elas ouvem, mas tapam os ouvidos para não escutar. Tem gente que precisa tirar a mão do ouvido e escutar. Hoje não é falta de informação, é falta de interesse para as pessoas saberem o que está se passando nos territórios indígenas.
As terras indígenas cumprem a função de garantir a preservação de grandes áreas florestais. Podemos dizer que os indígenas são os guardiões da floresta? Que papel eles têm exercido para frear o desmatamento e a degradação dos biomas brasileiros?
Muitos guardiões da floresta já morreram. Teve guardiões guajajaras que foram mortos, porque tentaram expulsar os invasores, o que deveria ser papel do Estado, que infelizmente não faz isso. Temos que ficar o tempo todo fiscalizando o território, olhando se tem um invasor, escutando e botando a cara, não só dentro do território, mas também fora. Eu falo que eu estou na mira, mas não posso me calar sobre o que está acontecendo no território. Nós somos os verdadeiros guardiões, porque estamos enfrentando todas as barreiras. Estamos enfrentando a polícia para barrar esses PLs que vão aumentar ainda mais a presença de invasores. A gente fala que não vai sair do território. O governo pode assinar qualquer papel, que a gente vai continuar sim, fiscalizando, denunciando, tentando salvar o pedaço de terra para nossos filhos. A gente não vai ficar calado. A gente está aqui enfrentando todo o santo dia. A gente não sabe se amanhã estaremos em pé, mas a gente continua falando. Mas todo dia que a gente acorda e vê que ainda estamos vivos, a gente sabe que tem que continuar em mais um dia de luta.
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