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A presença animada e articulada de ativistas LGBTQIAPN+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queers, intersexuais, assexuais, pansexuais e não-bináries) se fez notar já no primeiro debate da 17ª Conferência Nacional de Saúde, com o tema “O Brasil que temos. O Brasil que queremos”. Abertas as portas do auditório, houve grande correria para pegar os lugares próximos ao palco. Coube a Alícia Krüger ser a primeira palestrante da 17ª e vocalizar: “preciso dizer que sim, tem travesti nessa tribuna!”, sendo intensamente aplaudida. 

Farmacêutica, sanitarista e assessora de Políticas de Inclusão, Diversidade e Equidade em Saúde, da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS), ela fez um discurso arrebatador em defesa de mais equidade na saúde, problematizando os contextos em que pessoas trans são discriminadas, silenciadas e negligenciadas, tanto no cotidiano quanto nas políticas públicas. Ampliar a diversidade é abrir-se para novos olhares e pautas.

Na mesma tarde, as maiorias populacionais feminina e negra, historicamente minorizadas e que, nas últimas décadas, conquistaram protagonismo em movimentos sociais e conferências de saúde, viram-se representadas pela ex-conselheira nacional de saúde Michely Ribeiro, ativista da Rede Mulheres Negras do Paraná (RMN/PR) e das Organizações de Mulheres Negras do Brasil (AMNB). Em seu discurso, cobrou a implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra e lançou o desafio: “a democracia que queremos é aquela em que a mulher esteja no primeiro plano, em que a mulher negra seja protagonista do processo de mudança, em que o legado, o conhecimento e a experiência nas práticas coletivas sejam levados em consideração”.

A proposta de construção e implementação de uma Política Nacional de Comunicação Pública do SUS, a ser incorporada no Plano Nacional de Saúde, também foi discutida no primeiro dia. Apresentada pela Conferência Livre Nacional de Comunicação e Saúde, essa diretriz foi aprovada na 17ª e encampada como prioritária pelo Conselho Nacional de Saúde. Pela primeira vez, esteve presente em um debate central de conferência a defesa do direito à comunicação como indissociável e estruturante do direito à saúde e de uma comunicação pública dialógica como estratégia prioritária para o SUS, a ser protagonizada pela participação e o controle social na saúde. Para Radis, que defende essa visão, o acolhimento às propostas da comunicação foi um dos avanços da 17ª. 

Outro grupo a colocar suas pautas em um novo patamar foi o das pessoas com deficiência (PCD). Se a questão nas conferências anteriores era garantir acessibilidade em salas e auditórios, dessa vez, as pessoas com deficiência foram representadas por Vitória Bernardes, conselheira nacional de saúde pela entidade Amigos Múltiplos pela Esclerose (AME), na cerimônia de abertura, ao lado da ministra Nísia Trindade e outros ministros e, no encerramento, ao lado do presidente Lula. Cerca de 300 delegados, 100 deles eleitos em conferência livre com mais de mil participantes, defenderam com eloquência e aprovaram propostas de políticas para as “PCDs”. A mensagem foi dada: “nada sobre nós sem nós!”.

O clima de retomada da participação e da diversidade dominou a conferência que reuniu mais de 6 mil pessoas, sendo 4.048 delegados dos estados, do Distrito Federal e de 99 conferências livres, que elegeram 326 delegados. Radis enfoca os temas e debates relevantes nos 48 grupos de trabalho (GTs) e na Plenária Final da 17a. Ouvimos depoimentos e análises de delegados experientes e estreantes, ativistas, trabalhadores, gestores, pesquisadores, cidadãos que usam e defendem o SUS em todo o país.

A ex-presidente do Conselho Nacional de Saúde Maria do Socorro de Souza diz ter ficado “arrepiada” com o alcance das conferências livres na 17ª, trazendo “uma pauta humanitária”, com a defesa “das mulheres, dos negros, dos idosos, da população LGBTQIAPN+, da população do campo, da floresta e das águas”. Ela entende que essa é a pauta da “visibilidade dos sujeitos historicamente oprimidos”.

Nos GTs, houve tentativas de excluir integralmente as propostas que visavam a saúde e os direitos desses grupos. No entanto, na Plenária Final, essas propostas foram aprovadas por ampla maioria, com aplausos à equidade no SUS. O grito “Fica Nísia” foi constante em apoio à permanência da ministra da Saúde e rejeição à entrega do ministério ao Centrão. A garantia da permanência foi anunciada pelo presidente Lula na cerimônia de encerramento, quando ele também agradeceu a todos os profissionais de saúde por terem salvado tantas vidas na pandemia, enquanto o país era “governado por um genocida”.

Sonia Fleury, pesquisadora influente na elaboração do capítulo da Seguridade Social na Constituição, apontou a ausência nos debates centrais das discussões sobre aprendizados com a pandemia, desfinanciamento do SUS e a privatização por dentro do SUS. Em artigo reproduzido nesta edição, ela conclui que a 17ª será reconhecida como a conferência da diversidade e a que evidenciou “a incrível capacidade de renovação das lideranças que consegue manter vivo o movimento da Reforma Sanitária Brasileira”.

Rogério Lannes Rocha, Coordenador e editor-chefe do Programa Radis
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