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A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que acontecerá em Belém (PA), em novembro, cria uma grande expectativa pelas discussões que virão sobre as mudanças climáticas e o futuro da Terra, como ocorreu em 1992, com a Rio-92 (conhecida também como Eco-92 ou Cúpula da Terra) e, depois, em 2012, com a Rio+20, ambas realizadas no Rio de Janeiro. 

Desta vez a cúpula ocorre no “pulmão” do mundo e em um momento em que é preciso definir mais ações efetivas diante de tantas transformações que estão acontecendo no planeta, seja do ponto de vista climático ou geopolítico, em que se vê também a urgência do debate sobre as vulnerabilidades emergentes e as populações em risco. 

A origem da COP está intrinsecamente ligada à Rio-92, pois foi elaborada durante aquela conferência. Em seus quase 43 anos de história, o Programa Radis vem acompanhando não apenas as transformações ambientais e seus impactos sociais e na saúde, como também trouxe seu olhar sobre esses eventos de extrema relevância para a definição do progresso das políticas mundiais em relação ao desenvolvimento e a compatibilidade da vida em nosso planeta.

A expectativa e os ecos da Rio-92

A revista Súmula 43 (janeiro de 1992) trouxe as expectativas para a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), que ocorreu em julho daquele ano, no Rio de Janeiro. As análises prévias sobre o evento na publicação estavam presentes tanto pela perspectiva interna, por meio da Conferência de Saúde e Meio Ambiente, ocorrida na Fiocruz, quanto pela reunião preparatória entre os países, realizada em Genebra. 

Na conferência interna, esteve em destaque a relação entre saúde, doença e os fatores sociais, como a falta de saneamento básico, principalmente para a população mais pobre. No documento final, a ser enviado para a Rio-92, aparecia a recomendação de que era preciso atenção às chamadas “doenças da pobreza” (como, por exemplo, esquistossomose, leishmaniose, doença de Chagas, malária, entre outras). 

Em relação à Genebra, houve um embate entre países ricos e pobres, visto que havia a dificuldade entre as nações mais ricas de ceder em relação ao financiamento para a preservação ambiental e os países em desenvolvimento reivindicavam mudanças mais significativas, para que, de fato, a Rio-92 fosse efetiva e não apenas um encontro sem resoluções práticas.

Como naquele período, durante o governo Fernando Collor de Mello (1990-1992), o Programa Radis passou por grandes dificuldades, não houve mais publicações no ano de 1992. No entanto, a edição 18 da revista Tema (outubro de 1999) foi dedicada à Agenda 21, o documento resultante da Rio-92, sobre as resoluções para o desenvolvimento sustentável. A Tema trouxe a perspectiva da Agenda 21 brasileira, com os compromissos firmados pelo país até então e com a análise crítica do que havia progredido e do que não estava funcionando naquele momento como, por exemplo, a interface com a saúde.

COP15: a primeira a ganhar destaque

Em 1994, foi firmado o acordo que regia a realização anual da Conferência das Partes (COP) e a primeira delas ocorreu em 1995, em Berlim, na Alemanha. Durante os 30 anos de existência, algumas conferências tiveram definições mais marcantes, como a COP3 (1997), realizada em Quioto, no Japão, na qual ficou estabelecido o Protocolo de Quioto, que tinha o objetivo de definir metas para a redução dos gases do efeito estufa (GEE) para os países considerados desenvolvidos.

Nas páginas de Radis, a primeira cúpula a ser mais detalhada e analisada foi a COP15, realizada em Copenhague, Dinamarca, em dezembro de 2009. Foi uma COP com mais destaque midiático, apesar de não ter conseguido muitos avanços, visto que o documento final não estabeleceu metas tão claras. Mas, conforme a Radis 90 (fevereiro de 2010), pela primeira vez, as reivindicações de minorias estavam sendo levadas em consideração e, por consequência, compuseram as mesas de negociações.

Naquela mesma edição, o pós-tudo, escrito pela pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), Sandra Hacon, explicou não apenas o contexto da COP15 e suas definições como trouxe um resumo de todo o histórico das COPs realizadas até ali, bem como a Rio-92, e relembrou o primeiro evento mundial deste porte: a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, de 1972, realizada em Estocolmo, na Suécia.

A preparação e as expectativas para a Rio+20

Com o compromisso assumido pela ONU de realizar uma nova cúpula 20 anos após a Rio-92, em 2012 aconteceu a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. E antes mesmo do evento, em dezembro de 2011, a Rio+20 foi capa da Radis 112, trazendo a opinião de especialistas sobre as expectativas, os desafios e as controvérsias que cercavam a sua realização e, principalmente, sobre as propostas que seriam debatidas. A maior parte dos entrevistados via um grande potencial na conferência, mas não tinham muitas expectativas quanto a mudanças efetivas.

Na época, o então vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, Valcler Rangel Fernandes, falou sobre a importância de se colocar o combate à pobreza entre as pautas relacionadas à saúde, desenvolvimento e biodiversidade. Ele explicou que a exploração sustentável da biodiversidade pode gerar renda para as comunidades, mas que existem as doenças cuja ocorrência têm ligação direta às condições de pobreza. “Há uma relação direta entre a perda da biodiversidade e a perpetuação da pobreza”, constatou.

Em junho de 2012, mês da realização da Rio+20, a conferência foi capa de Radis, na edição 118. Com a matéria intitulada Sem saúde não há sustentabilidade, o tema principal foi a falta de clareza em relação à saúde no documento oficial para o evento e como isso impactava na busca pelo desenvolvimento sustentável. 

O sanitarista Paulo Buss, coordenador do Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris/Fiocruz), enfatizou a importância dessa relação: “O desenvolvimento não pode ser degradante para o ambiente, porque aí se fecha um ciclo vicioso, negativo, em que o crescimento desmesurado gera populações doentes, que vão empobrecer, que não vão contribuir para o verdadeiro desenvolvimento. Não se assegura desenvolvimento sustentável se não houver uma população saudável”, afirmou na época. 

As fotos que ilustravam a edição, do fotógrafo e ambientalista francês Yann Arthus-Bertrand, destacavam a beleza e, ao mesmo tempo, a fragilidade do planeta. Um dos pontos importantes da matéria de capa também foi a opinião dos entrevistados respondendo ao seguinte questionamento: “Rio+20 terá valido a pena se…”. Cândido Grzybowski, sociólogo e na época diretor-geral do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), respondeu com a avaliação: “A Rio+20 só terá sentido se for o marco histórico de uma vontade coletiva, para mudar inteiramente o modo como nós pensamos e nos relacionamos, entre nós e com a natureza. Estamos no caminho do desastre”. Em paralelo à conferência, também ocorreu uma nova edição da Cúpula dos Povos, com representantes da sociedade civil do mundo todo, com o objetivo de fortalecer os movimentos sociais e debater sobre a crise ambiental e o desenvolvimento de forma autônoma [Leia mais clicando aqui].

Radis na Rio+20: documento e crítica de um momento histórico 

— Foto: Eduardo de Oliveira.

— Nossa capa: foto de Eduardo de Oliveira.

“Durante nove dias, o Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, transformou-se em ponto de convergência de lutas por justiça social e ambiental”. Assim Radis descreveu o cenário de efervescência observado na Cúpula dos Povos, realizada de 15 a 23 de junho de 2012, em paralelo à Rio+20. A cobertura completa dos dois encontros foi registrada na edição 121 (especial de setembro e outubro de 2012), em que Radis — que até então contava com 24 páginas — ganhou o dobro disso para acompanhar o epicentro dos debates ambientais que ocorreram no Rio de Janeiro.

A revista trouxe sete entrevistas especiais, incluindo o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos; o economista norte-americano Jeffrey Sachs; a fundadora do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (Miqcb) e líder quilombola, dona Dijé (Maria de Jesus Ferreira Bringelo); a socióloga baiana Ângela Guimarães, na época presidente do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve); a geóloga Lúcia Ortiz, integrante do Grupo de Articulação da Cúpula dos Povos; o então diretor do Programa Internacional de Segurança Ambiental e do Programa de Sustentabilidade da Cruz Verde Internacional, Paul Walker; e a física e ativista indiana Vandana Shiva. 

O encontro foi considerado um ponto de partida, de acordo com algumas avaliações; já outros demonstraram insatisfação, colocando a Rio+20 como um momento perdido. A conclusão, naquele momento, foi de que as discussões ficaram aquém em relação ao tema do desenvolvimento sustentável. Com o título O Futuro Que Queremos, o documento final indicava que a agenda ambiental precisava continuar em pauta, o que foi repercutido na capa da edição: “A Rio+20 não acabou: Agora é a mobilização pelo futuro que queremos”. 

Em relação à saúde, houve um avanço com a inclusão de uma seção especial sobre saúde e população no texto final, visto que no documento preparatório não havia menção. “Reconhecemos que saúde é uma condição prévia, bem como um resultado e um indicador de todas as três dimensões do desenvolvimento sustentável”, destacava o texto que abria a seção.

Para o economista norte-americano Jeffrey Sachs, considerado um dos mais importantes do mundo, entrevistado durante a conferência, o combate à pobreza extrema, apontado como o maior avanço do documento da Rio+20, realmente deveria ser a prioridade dos objetivos do desenvolvimento sustentável. “Essa meta deve estar acima das demais. É a mais urgente. As pessoas que vivem em um estado de extrema pobreza lutam por sua sobrevivência todos os dias”, afirmou à Radis. “Além disso, estou extremamente preocupado com a possibilidade de as mudanças climáticas reverterem os ganhos de redução da pobreza, já que a maioria dos pobres do mundo vive em ambientes hostis”.

— Foto: Eduardo de Oliveira.

Já dona Dijé (que faleceu aos 70 anos em 2018), fundadora do Miqcb e, na época, coordenadora de políticas públicas da Associação em Áreas de Assentamento no estado do Maranhão, conversou com Radis durante a Cúpula dos Povos e falou sobre sua trajetória de ativismo, a luta de mulheres como ela e de outros quilombolas e quais eram suas expectativas para aquela Conferência.

Por causa de seu trabalho como quebradeira de coco, função passada de geração a geração, ela frisava a importância do direito de ir e vir e por isso que estava ali para debater: “Terra pra quem nela trabalha, pra quem nela mora. Que não haja cerca que me impeça de ir e vir; que tanto faça ser a minha terra, que é coletiva, como área privada”.


Um cigano parceiro na COP

Na COP28, realizada em Dubai, nos Emirados Árabes, no final de 2023, Radis contou com a parceria de Aluízio de Azevedo, cigano da etnia Calon, que esteve no encontro como representante dos povos ciganos no Comitê Estadual dos Povos e Comunidades Tradicionais do Mato Grosso. Jornalista e, na época, pós-doutorando do Laboratório de Comunicação e Saúde (Laces) do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), Aluízio trouxe um relato sobre os debates da COP28, o papel dos povos ciganos no meio ambiente e as desigualdade escancaradas em Dubai. 

No texto Um cigano na COP, publicado na edição 256 de Radis (janeiro de 2024), Aluízio parte de uma pergunta: como a participação de um povo sem território poderia fazer sentido em um debate em que territórios tradicionais e a Floresta Amazônica tinham grande destaque? “Para o Brasil avançar no debate das injustiças climáticas, é necessário urgentemente conhecer e reconhecer a contribuição dos povos e comunidades tradicionais para a conservação do planeta, inclusive dos povos ciganos e seus três troncos étnicos Romani (os Calon, os Rom e os Sinti), tanto para o desenvolvimento econômico, histórico, cultural e social do país, quanto para a conservação da natureza”, escreveu.

“O provérbio Romani que nos ensina a pensar que o céu é o meu teto, a terra é a minha pátria e a liberdade minha religião, nos leva para uma compreensão integralista entre seres humanos e o ambiente, ou entre a natureza e a cultura, uma visão que se aproxima muito de outras comunidades tradicionais”, disse ainda.

Em outro texto, intitulado O sentir quilombola na COP28, Aluízio trouxe a trajetória de Laura Ferreira, do quilombo Ribeirão da Mutuca, território de Mata Cavalo, no Mato Grosso. Em depoimento ao repórter, Laura falou sobre a importância de perceber que os territórios não são apenas biomas e que lá existem povos, que estão lutando pela preservação como parte daquele ambiente e de sua própria cultura.

“Interagimos com outros atores e países e mostramos que no Cerrado e no Pantanal não temos só fauna e flora. Temos seres humanos que habitam esses espaços, de onde advém toda a sua cultura e tradicionalidade”, contou à época.

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