Na calada da noite, na última sessão do Congresso Nacional antes de entrar em recesso no meio do ano de 2025, e permitindo votação virtual, os deputados aprovaram o chamado “PL da Devastação”, que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental no país. Durante a madrugada (17/7), 267 parlamentares votaram a favor do Projeto de Lei nº 2.159/2021, enquanto 116 foram contra.
A quatro meses de sediar a COP30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que acontecerá em novembro, em Belém (PA), o Brasil fica assim mais perto de aprovar um projeto que é considerado o maior retrocesso recente das políticas ambientais.
Imediatamente após a aprovação na Câmara dos Deputados, organizações defensoras do meio ambiente lançaram na internet uma campanha que pede o veto do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (@vetalulapldadevastação). A proposta ainda precisa passar pela aprovação de Lula para entrar em vigor. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, fez duras críticas ao projeto. “Fere de morte um dos principais instrumentos de proteção ambiental do país”, declarou.
O PL havia sido aprovado pelo Senado em maio (Radis 273). Entre as mudanças, permite que empreendimentos de grande potencial poluidor, como mineração e obras de infraestrutura e energia, obtenham licença de forma automática apenas com base na autodeclaração do empreendedor, sem necessidade de análises técnicas prévias.
A coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo, em entrevista ao jornal O Globo (17/7), afirmou que o texto aprovado é um “crime histórico contra a natureza e uma vergonha para o Brasil, que tenta se colocar como um líder climático”.
Outros pontos do PL criticados por ambientalistas e movimentos sociais são a criação da Licença Ambiental Especial (LAE) para projetos estratégicos definidos pelo governo, a inclusão de grandes empreendimentos de mineração na dispensa de licenças e a emenda que acelera a exploração de petróleo na Margem Equatorial (região da costa brasileira que se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte, incluindo a Foz do Rio Amazonas).
Veja algumas repercussões
Enquanto o mundo enfrenta uma emergência climática, nossos parlamentares colocam a natureza e a vida em risco para atender a interesses do agronegócio e das mineradoras
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib)
A aprovação do PL da Devastação é um crime não só contra a natureza, mas também contra a humanidade. Não há outra coisa a dizer: Congresso inimigo do povo! Veta, Lula!
Articulação Nacional de Agroecologia (ANA)
O projeto enfraquece o licenciamento ambiental, facilita o avanço de grandes empreendimentos sem consulta às comunidades afetadas e escancara as portas para mais desmatamento
Cúpula dos Povos
Meia-noite, plenário vazio, com votação virtual, e coloca-se em pauta o projeto extremamente estruturante para a política socioambiental do Brasil, que pode significar, caso aprovado, o maior retrocesso da história do licenciamento ambiental brasileiro
Deputada federal Duda Salabert (PDT-MG)
Em vez de aperfeiçoar as regras do licenciamento e a avaliação de impactos ambientais, o Congresso optou por consolidar a lei da não-licença e o autolicenciamento. Um apertar de botão, sem apresentação prévia de qualquer estudo ambiental, será o procedimento padrão que gerará a maior parte das licenças no país, na modalidade por Adesão e Compromisso. Já a chamada Licença Ambiental Especial, criada para facilitar grandes empreendimentos, é oficialmente guiada por interesses políticos. Terras indígenas não homologadas e territórios quilombolas não titulados serão ignorados nos processos, afastando-se direitos fundamentais assegurados pela Constituição. É uma tragédia para nossa política ambiental
Suely Araújo, coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima
Principais pontos do “PL da Devastação”
- Licença por Adesão e Compromisso (LAC): permite que empreendimentos sejam licenciados automaticamente, sem estudos dos impactos ambientais
- Enfraquecimento dos órgãos ambientais: reduz a atuação do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e conselhos estaduais
- LAE (Licença Ambiental Especial): permite ao governo federal acelerar o licenciamento de empreendimentos considerados estratégicos, mesmo que possam causar degradação ambiental
- Retira a proteção de territórios indígenas e quilombolas ainda em processo de demarcação
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