O que aconteceu com os Yanomami?
Como você já leu aqui na Radis, os últimos anos não têm sido fáceis para a população indígena no Brasil. No caso dos Yanomami, o problema é a invasão de terras pela mineração ilegal, há muito denunciada por lideranças da região. A situação se agravou em janeiro de 2023, quando a agência Sumaúma denunciou a morte de 570 crianças por causas evitáveis na Terra Indígena Yanomami (TIY), entre 2019 e 2022. Em 20 de janeiro, o Ministério da Saúde declarou Emergência Sanitária de Importância Nacional (Espin) e uma grande mobilização se seguiu, com a criação do Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública (COE Yanomami), em Boa Vista, capital de Roraima. Radis foi uma das primeiras equipes de jornalismo a acompanhar as atividades de assistência emergencial e as tentativas de reestruturação da infraestrutura de saúde em terras indígenas (Radis 247).
Naquele momento, gestores e líderes indígenas já identificavam a complexidade da situação, como diagnosticou Ana Lúcia Pontes, em entrevista à Radis: “O problema é crônico, em todas as dimensões, e não é somente da Saúde”, declarou a então coordenadora do COE. “O nosso território Yanomami foi destruído nos últimos quatro anos”, declarou Dario Kopenawa. A mobilização contra a desassistência (com números alarmantes de desnutrição, malária e déficit de vacinação) revelou que os problemas não estavam somente no território, mas também na Casa de Saúde Indígena Yanomami, na capital de Roraima, e mobilizou voluntários e profissionais do SUS de todo o Brasil.
Como estão os Yanomami em 2024?
Um ano após a declaração da Emergência Sanitária, os problemas no território Yanomami continuam. Relatório lançado pela Hutukara Associação Yanomami em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA), em 26 de janeiro de 2024, aponta que a área de garimpo ilegal cresceu 7% na TYI e atingiu 5.432 hectares em 2023.
O documento, que usa dados referentes à presença de garimpeiros e de áreas desmatadas na região, mostra que, apesar da diminuição do avanço da mineração ilegal (eram 54%, em 2022), a atividade criminosa ainda produz “efeitos nocivos” à população indígena, seja nos níveis de saúde, seja na preservação ambiental. Vinte e uma das 37 regiões da TI Yanomami registraram casos de desmatamento associados ao garimpo, no período avaliado pelo relatório. O levantamento credita o retorno e a permanência da mineração no território ao “relaxamento das ações de repressão, especialmente depois que as Forças Armadas assumiram um maior protagonismo nas operações” e reafirma que a saúde dos Yanomami só será restabelecida com a expulsão completa dos garimpeiros do território, em consonância com o que disse em entrevista à Radis o secretário Weibe Tapeba (veja entrevista clicando aqui).
Quais os problemas de saúde enfrentados pelos Yanomami?
Até novembro de 2023, segundo a Secretária Especial de Saúde Indígena (Sesai), foram registrados na Terra Indígena Yanomami:
- 649 casos de malária — foram 15.561 em 2022
- 5.598 casos de síndrome respiratória grave — 2.478 em 2022
- 20.524 casos de síndrome gripal — 3.203 em 2022
- 9.550 casos de doenças diarreicas agudas — 5.902 em 2022
O que está sendo feito em 2024?
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, já reconheceu que o governo federal subestimou a crise na TIY. Em 11 de janeiro de 2024, ela integrou uma comitiva de ministros que voltou a Roraima para monitorar a situação, quando o governo anunciou um investimento de R$ 1,2 bilhão em ações voltadas ao território, sobretudo na segurança e acesso a políticas públicas pelos indígenas. Em um comunicado oficial, o Ministério da Saúde divulgou que aumentou o efetivo de profissionais, dobrou o investimento em ações de saúde e trabalhou para garantir a assistência e combater as principais doenças, como a malária e a desnutrição no território Yanomami.
Apesar do comprometimento interministerial, notícia divulgada pela Folha de S. Paulo (24/1) mostra que, mesmo sendo responsáveis pela logística da operação na TIY, “os militares não entregaram nem metade das cestas básicas para os indígenas”. O jornal ainda anunciou que as Forças Armadas solicitaram um valor de R$ 993 mil por dia para manter o suporte às atividades de assistência na região.
A denúncia foi feita um dia depois de a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) fazer uma petição ao ministro Luís Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), apontando que o Ministério da Defesa não havia providenciado, ao longo de 2023, o apoio necessário à operação de retirada dos garimpeiros e de socorro aos indígenas da TIY — contrariando as diretrizes contidas no decreto assinado pelo presidente Lula, em janeiro de 2023.
Em 17 de janeiro de 2024, a Hutukara Associação Yanomami já havia denunciado que a Aeronáutica estava impedindo que a entidade realizasse voos para comprovação da extensão e do retorno do garimpo. “A recusa da Aeronáutica coincide com a volta de inúmeros voos ilegais e clandestinos de garimpeiros na terra indígena”, registrou a Agência Pública (17/1). “Culpar o Ministério dos Povos Indígenas e a Funai pela atual situação na Terra Indígena Yanomami revela, no mínimo, uma enorme incompreensão sobre o funcionamento da operação de socorro aos indígenas e de retirada dos invasores garimpeiros”, criticou Rubens Valente, no mesmo dia, em um artigo onde classificou como “sabotagem” a postura dos militares na TIY.
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