Na sala de comando do Samu 192, ao mesmo tempo em que atende demandas do próprio trabalho, a coronel Bárbara Alcântara recebe Radis, para uma conversa inicial sobre a produção de mais uma reportagem sobre o serviço, responsável por socorrer vidas em uma cidade em que a população ultrapassa 6 milhões de pessoas. A rotina da coordenadora geral do Samu na cidade do Rio de Janeiro é corrida. Ela está à frente de uma equipe de mais de 2 mil trabalhadores, que executam um trabalho delicado e essencial no atendimento de urgências na cidade, e que é reconhecido e respeitado em todo o país. Na conversa em que autorizou a equipe de reportagem a acompanhar uma das equipes de plantão do Samu em uma das maiores cidades do país [Leia a reportagem aqui], Bárbara, que é enfermeira de formação, conta como chegou ao posto que ocupa, tira dúvidas sobre o funcionamento do serviço e fala sobre os desafios de estar à frente do Samu 192.
Como você chegou ao Samu?
Eu sou bombeira há 25 anos. Mas a minha formação é de enfermeira, entrei no Corpo de Bombeiros para o quadro de oficial de saúde. Lá, já tive oportunidade de participar do serviço de atendimento pré-hospitalar móvel. Na época, era o Grupamento de Socorro e Emergência (GSE), que era referência nacional. Não tínhamos Samu instituído no país. Em 2016, recebi um convite do então secretário de saúde do estado para assumir o Transporte Inter-Hospitalar (TIH), num momento desafiante em que a secretaria de saúde passava por um momento delicado de reestruturação. Até então, o TIH fazia parte da estrutura direta da secretaria e na ocasião dispunha de apenas uma uma viatura. O estado do Rio estava muito defasado e estas questões também impactavam o serviço de urgência e o TIH.
Quais desafios enfrentou naquele momento?
Muitos foram os desafios. Quando cheguei, só tínhamos uma ambulância funcionando. Não havia contratos estabelecidos para abastecimento, manutenção, recursos humanos. Fomos expandindo com muito trabalho, apoio e gestão da SES. Em 2020, o Samu deixou de ser gerenciado pelo Corpo de Bombeiros e passou a ser gerido pela Secretaria de Saúde. Em setembro do mesmo ano, passou para a gestão da Fundação Saúde. Em 2023, o serviço já contava com 10 ambulâncias equipadas para suporte avançado, distribuídas em unidades hospitalares estaduais; o TIH passou a compor a estrutura do Samu. Em agosto de 2023, o serviço já contava com 44 ambulâncias. Fiquei no TIH até setembro de 2024, quando fui convidada para assumir esse novo desafio.
E qual o seu maior desafio, hoje?
O maior desafio é gerenciar quase 2.400 pessoas e obter o melhor resultado. Embora tenhamos gestões diretas, para que possamos prestar o atendimento à população, respeitando não só a questão do tempo-resposta, enfrentamos desafios para que o serviço se mantenha em atividade. Estou falando não só do dinamismo operacional, do momento que a ambulância sai para atender, mas também o que está nos bastidores. A gente tem que pensar em ter o profissional adequado, com o equipamento adequado, no tipo de ambulância, em como chegar a determinados locais. Nem tudo é fácil. A gente tem áreas totalmente vulneráveis e o grande desafio do Samu, hoje, é atender essa população.
A violência é um grande problema?
É um problema. O Rio de Janeiro, onde quer que se esteja, é uma área de risco. Obviamente algumas regiões são mais vulneráveis e perigosas. Mas, independentemente do local da solicitação, a gente vai atender. Salvo os casos — que não são poucos — em que somos impedidos. Acontece. Às vezes a equipe chega a uma região, tem uma barricada, não pode entrar. Ou chega a uma área que está conflagrada, como já aconteceu. A gente está atendendo e o tiroteio pode acontecer, há outras situações em que há abordagem direta da nossa equipe. Essa é uma realidade que impacta o profissional que está lá, que se sente acuado.
Como lidar com essas situações?
O profissional tenta, na medida do possível, explicar que está ali para fazer um atendimento de uma pessoa da comunidade; que está ali para isso. Nem sempre a gente vai ter 100% de certeza que vai conseguir entrar. E não é porque o Samu não queira. É muito importante dizer isso. Em todas as ocorrências abertas, o Samu vai enviar ambulâncias. Para todos os casos. Mas se vai conseguir chegar ao local, aí a situação é outra. Há momentos em que a equipe vai ter impedimento, seja ele físico ou de risco iminente. Até porque o macacão do Samu não é à prova de bala. Temos uma responsabilidade com o solicitante, mas também com o profissional, seja ele condutor, médico, enfermeiro ou técnico.
Qual a diferença do atendimento prestado pelo Samu (192) do que oferece o Corpo de Bombeiros (193) ?
Na capital, a gente tem um serviço de atendimento móvel de urgência muito ativo, com uma frota gigantesca, e um serviço de atendimento pré-hospitalar móvel executado pelo Corpo de Bombeiros do estado do Rio de Janeiro. De acordo com as diretrizes do Ministério da Saúde, não há nada que o Samu não possa atender. Dessa forma, atendemos qualquer tipo de situação de urgência e emergência. Mas, pela robustez da capital do Rio de Janeiro, no que diz respeito ao APH, há um fluxo que determina que o Samu atende preferencialmente os eventos clínicos em via pública ou residência, eventos obstétricos, pacientes com transtornos psiquiátricos, entre outros. No entanto, nosso objetivo sempre será chegar à vítima o mais rápido possível.
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