A exploração de petróleo na Margem Equatorial reacende um dilema: crescimento econômico e preservação ambiental são, de fato, conciliáveis? O governo federal defende que o potencial da região, com até 10 bilhões de barris, segundo levantamento de 2023 do Ministério das Minas e Energias (MME), é estratégico para o desenvolvimento nacional. A promessa: 350 mil empregos e aumento na arrecadação. O preço? Riscos ambientais irreversíveis, como alerta o Ibama, que já negou a licença solicitada pela Petrobras.
O Cone Amazônico, um recife recém-descoberto e essencial para o equilíbrio climático, pode ser gravemente afetado. Estudos apontam 18 impactos negativos, incluindo danos à fauna marinha e prejuízos à pesca artesanal. Para milhares de famílias que dependem desse sustento, o petróleo não representa progresso, mas o fim de sua principal fonte de renda.
A possibilidade de um vazamento não é remota. O Brasil tem um histórico preocupante de acidentes ambientais. Em 2000, 1,3 milhão de litros de óleo vazaram na Baía de Guanabara. Em 2019, manchas misteriosas afetaram mais de mil quilômetros do litoral nordestino, comprometendo ecossistemas e a economia pesqueira. Esses episódios mostram que os riscos não são teóricos — são uma ameaça concreta, especialmente em áreas frágeis como a Foz do Amazonas.
O governo alega que os lucros do petróleo financiariam a transição para energias limpas. Mas essa lógica esbarra em um paradoxo: se o futuro está nas fontes renováveis, como solar, eólica e biomassa — que já representam cerca de 48% da matriz energética brasileira —, por que insistir em abrir novas frentes de exploração fóssil? O relatório de 2022 do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) destaca a urgência de reduzir as emissões globais de gases de efeito estufa em 43% até 2030 para conter o aquecimento global e limitar o aumento da temperatura a 1,5°C. Para alcançar esse objetivo, não basta reduzir o consumo atual de combustíveis fósseis. É essencial interromper novos projetos que ampliem a dependência dessas fontes.
A exploração petrolífera na Guiana, a 150 km da Foz do Amazonas, é usada como justificativa para o projeto brasileiro, mas essa comparação é enganosa, pois ignora fatores essenciais. A Guiana iniciou a exploração após anos de estudos e exigiu infraestrutura robusta para conter vazamentos. O Brasil, por sua vez, tem um acúmulo de falhas no gerenciamento de desastres ambientais. A ausência de um plano de emergência eficaz reforça a insegurança sobre os riscos de um vazamento na Foz do Amazonas. Além disso, as condições ambientais são distintas. Correntes marítimas podem levar o óleo a manguezais e berçários marinhos, comprometendo ecossistemas únicos. Nenhuma tecnologia existente pode garantir a contenção total desses danos.
Em 2025, o Brasil sediará a COP 30 em Belém. Será o momento de reafirmar, diante do mundo, o compromisso com a preservação ambiental. No entanto, ao mesmo tempo em que se apresenta como defensor do clima, o governo brasileiro discute abrir uma nova fronteira de exploração petrolífera. Essa contradição fragiliza o discurso ambientalista do país. Como convencer outras nações a reduzir suas emissões enquanto ampliamos a produção de combustíveis fósseis?
A conclusão a que se chega é a seguinte: o futuro não se perfura. A exploração de petróleo na Margem Equatorial não se resume a um embate entre progresso e preservação. O verdadeiro dilema é escolher entre repetir o modelo extrativista do passado ou liderar, de forma consistente, a transição energética global. A Foz do Amazonas é uma fronteira ecológica, científica e econômica. Explorar essa região traz riscos ambientais irreversíveis e ganhos econômicos duvidosos.
O Brasil tem a possibilidade de se tornar uma potência climática com base em seus recursos renováveis, liderando pelo exemplo e abrindo novas perspectivas para o Sul Global. O país está diante de uma encruzilhada histórica. Apostará no extrativismo predatório, comprometendo ecossistemas e sua posição global, ou liderará a transição energética com um modelo sustentável e inovador? O futuro não espera. O tempo para agir é agora.
■ Geógrafa, mestre em Planejamento Urbano e Regional, com MBA em Inteligência Artificial para Negócios. Atua na interseção entre tecnologia, território e justiça climática, investigando as dinâmicas geopolíticas e socioambientais contemporâneas.
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