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“Boa tarde, Adriano! Eu lembro, sim, da entrevista. É um prazer falar com você de novo”. A mensagem, enviada pelo celular, era uma resposta ao meu pedido feito ao agente comunitário de saúde Roque Onorato, para que a gente atualizasse a conversa que tivemos em 2009, quando fiz a cobertura do 2º Encontro Nacional de Agentes Comunitários de Saúde e de Combate às Endemias em Valença, no Sul da Bahia (Radis 82). 

Uma resposta ágil e assertiva dada por um homem que, aos 86 anos, ainda é uma referência para os colegas de profissão que ele mesmo abraçou quando já passava dos 50 anos de idade. No momento da primeira conversa com Radis, em 2009, seu Roque havia acabado de se aposentar e recebia as homenagens devidas dos colegas, que viam em sua figura, altiva e acolhedora, uma referência pessoal e profissional. 

Na conversa recente, em novembro de 2024, ele explica que, apesar de aposentado, continua na lida: “Hoje estou com mais trabalho do que quando estava na ativa”, diz ao telefone, direto de Valença, informando que no momento aguarda a definição da nova gestão municipal — que assume em janeiro de 2025 — para conclusão de um trabalho de mapeamento dos agentes comunitários de saúde e de endemias. 

“Continuo cuidando do povo, daquelas pessoas que mais precisam”, afirma, dizendo se sentir grato por ajudar a colocar em prática o que existe nos programas e políticas de saúde, mas que, em muitos momentos não é executado, em parte por falta de interesse, em parte por falta de recursos ou conhecimento. “Minha formação é de agente comunitário, mas passei a estudar muito a educação popular em saúde depois que me aposentei”, conta.

Seu Roque, que foi presidente do Sindicato dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e Agentes de Combate às Endemias (ACE) de Valença e dos municípios da região, é hoje presidente de honra da Confederação Nacional dos Agentes Comunitários de Saúde e de Combate às Endemias (Conacs) e integrante da federação baiana dos agentes, que ajudou a fundar. Seu cotidiano se divide entre as reuniões com lideranças, algumas palestras em eventos onde relata sua experiência e viagens a Brasília, fazendo parte das lutas pelas melhorias de condições de trabalho da categoria. 

Pelas suas contas, são 32 anos de trabalho como ACS, mas ele faz questão de frisar: “Até hoje não deixei de ser agente”. 

E de 2009 para cá, o que mudou? Ele considera que houve alguns avanços, com a oferta de capacitação técnica para os colegas ACS, e destaca a importância de acompanhar as Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) que tramitam no Congresso e que tratam de questões importantes para a categoria [A PEC 14/2021, que estabelece o Sistema de Proteção Social e Valorização dos Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate às Endemias e trata de assuntos como vínculo empregatício e aposentadoria especial e exclusiva; e a PEC 18/2022, que trata de piso salarial diferenciado para os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias].

“Hoje vejo muita gente desanimada. Perdemos muito o brilho”, diz seu Roque, avaliando que os agentes trabalham com um número muito grande de procedimentos (e de pessoas), o que em sua visão compromete a qualidade do serviço. Ele diz que luta e espera por mudanças, por enxergar que esses profissionais são fundamentais na condução das políticas do SUS: “Se houver condição de trabalho — que hoje, apesar de muitos avanços, ainda é falha — o atendimento dos usuários do SUS será o melhor possível”, explica.

Seu Roque avalia que os municípios têm investido pouco na relação com os profissionais e critica mudanças na atuação de alguns profissionais, como a “visita” feita por meio dos aparelhos de celular. “A gente tinha mais comprometimento”, analisa, revelando sentir falta dos momentos em que estava realmente próximo à comunidade, quando aprendia com eles e ainda colaborava para que tivessem melhor qualidade de vida.

Apesar da falta que sente por não estar mais à frente das entidades, ele comemora o tempo maior para cuidar da esposa, Rosália, e curtir a família, que cresceu de 2009 para cá. “Hoje eu já tenho até uma trineta”, ressalta, revelando que duas das netas, gêmeas, o ajudam com os contatos — “São minhas secretárias” — e um filho e um sobrinho seguem seus passos, como agentes de endemias. 

Por outro lado, ele se alegra as homenagens recebidas, incluindo-se o título de doutor honoris causa dado pela Faculdade de Formação e Especialização Brasileira e Internacional de Capelania (Febraica) e pela Ordem dos Capelães do Brasil (OCB) — “Hoje eu sou doutor!” — e antecipa planos para 2025: “Quero montar um projeto para trabalhar com os agentes comunitários de saúde nos municípios, melhorando a autoestima dessas pessoas”, revela.

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