1. A visita
O interfone toca. “Dona Nadir, somos da saúde da família, viemos ver a senhora”, diz o médico Marcos Herkenhoff, 26 anos. Do outro lado, silêncio. Um ruído que parece ser uma troca de palavras. De cá, expectativa. “A gente veio aqui anteontem”, lembra a agente comunitária de saúde Thaís Villela, e suas palavras reforçam a confiança de que a visita será exitosa. Em seguida, uma voz de mulher responde: “Pois não, vamos abrir”.
Depois de subir quatro andares de escada, no edifício sem elevador, em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio de Janeiro, a equipe do Centro Municipal de Saúde Maria Augusta Estrella, na empreitada da visita domiciliar, encontra uma Dona Nadir sorridente e receptiva, aos seus 89 anos, acompanhada de sua nora Mônica. Elas convidam os visitantes para se sentar no sofá de uma sala ampla, iluminada pelo sol da manhã. À primeira pergunta de “como tem passado”, Dona Nadir já se abre: “Daqui pra baixo dói tudo. Não salva nada.”
O residente em medicina de família e comunidade, Marcos Herkenhoff, orienta dona Nair e a família na consulta domiciliar. — Foto: Fernanda Andrade.
Ela mescla tons de bom humor e de queixa na voz. Marcos ouve atento, com os olhos postos nela, os dois sentados no sofá. “Sinto uma cãibra toda noite que está me prejudicando a dormir”, diz, confessando o abuso do medicamento para dor. O jovem médico, residente em medicina de família e comunidade, esclarece sobre o uso correto do remédio, pergunta, escuta, orienta.
Dona Nadir reclama do calor, de cansaço e moleza. Mas conversa com Marcos animada, como quem recebe um velho amigo. “Ando muito sem apetite”, relata. A nora, um pouco atrás dela, faz uma negativa com o dedo e sorri, como se dissesse que ela se alimenta bem. A idosa fala baixinho: “Estou muito sensível. Choro à toa”. A nora brinca: “Mas se fizer uma rabada ou uma feijoada, ela fica feliz”.
O neto Lucas, que tem quase a mesma idade do médico, também se junta à consulta: “A senhora só podia fazer uma moela um pouco menos salgada”, opina. A consulta acontece, literalmente, em família. Marcos explica à idosa e aos familiares: “Não tem nada que caracterize depressão. Ela só está desanimadinha.”
Dona Nadir vai completar 90 anos em janeiro de 2025. À Radis, que acompanha a visita, ela conta que possui quatro bisnetos e sete netos — dois destes moram na mesma casa que ela, a nora e o filho. Marcos orienta alguns exercícios físicos leves, como levantar e sentar no sofá, repetidas vezes, esclarece sobre a medicação para a dor e reforça para ela se alimentar bem. “Só não precisa fazer um joelho de porco toda semana”, brinca.
“Então já posso ir para a gandaia?”, pergunta a idosa. A visita da equipe de saúde da família promoveu em dona Nadir — e em seus familiares — uma injeção de ânimo. Ela se despede, emocionada. Na saída, resume em uma frase o sentimento em receber um médico de família em sua casa: “Não tem palavra para expressar o valor”.
Visitas domiciliares fazem parte da rotina da Estratégia Saúde da Família (ESF), modelo que completou 30 anos em 2024 e é reconhecido por orientar o cuidado na atenção primária do maior sistema público de saúde do mundo, o SUS. Médicos de família e comunidade, agentes comunitários de saúde (ACS), enfermeiros e técnicos de enfermagem que formam essas equipes básicas estão não apenas na unidade de saúde, dentro de consultórios, mas nas ruas e nas casas — nas favelas, praças, quadras, bairros, vilas, distritos, povoados, assentamentos e comunidades tradicionais.
Para entrar na casa das pessoas, já diziam os antigos, é preciso pedir licença. E mais: há que se dispor a ouvir, sem julgamentos. “O essencial é se interessar pelo paciente”, resume Marcos, capixaba de Vitória, que cursa o primeiro ano de Residência em Medicina de Família e Comunidade (MFC) na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Segundo ele, a palavra que melhor descreve a ESF é vínculo. De fato, construir vínculos entre as pessoas e o SUS é o papel das equipes que atuam na saúde da família. “A gente só consegue acessar algumas coisas e, consequentemente, abordar como elas estão influenciando o adoecimento a partir do vínculo e da confiança que permitem que o paciente se sinta à vontade para abrir e compartilhar sua história”, descreve o residente.
Marcos é médico da equipe Via Láctea do Centro Municipal de Saúde Maria Augusta Estrella, em Vila Isabel. Isso significa que ele é o responsável por atender as pessoas que residem nessa área, como Dona Nadir. A unidade, que fica aos pés do Morro dos Macacos, no Rio de Janeiro, possui 34.470 pessoas cadastradas e distribuídas entre 10 equipes, segundo números de novembro de 2024, para uma população total de cerca de 74 mil moradores dos bairros da região.
Naquela sexta-feira nublada de novembro, que intercalava chuva fina e sol, acompanhamos a rotina de três residentes em medicina de família e comunidade para entender as motivações e os desafios desses jovens médicos do SUS. Por volta de 9h, saímos com Marcos e Thaís para as visitas domiciliares da manhã. A primeira foi Dona Nadir, em uma rua de ladeira. Na saída de sua casa, Marcos confirma o que observamos: mais do que qualquer prescrição médica, o que deixou a idosa feliz foi a conversa.
2. Os encontros
Do alto do cruzeiro, no Morro dos Macacos, se vê boa parte dos bairros da Zona Norte. É de lá que Beatriz Pinheiro Machado contempla as casas atendidas por sua equipe e reflete sobre o quanto somos pequeninos diante do infinito do mundo. Ainda assim, cada história, cada vida, cada relato merece ser ouvido e acolhido.
“A pessoa se sente cuidada e agradecida por saber que pode confiar em alguém para acompanhá-la”, descreve. Com 26 anos, Beatriz é médica do segundo ano de Residência em MFC, também pela Uerj. Ela conta que questões que estão muito além do individual, como condições de higiene, saneamento básico e acesso à alimentação perpassam o dia a dia da saúde. “A gente lida com realidades discrepantes, com insegurança alimentar e a violência no território o tempo inteiro: a ameaça constante à vida”, relata.
“Para promover saúde, é preciso entender a pessoa como um todo”, afirma Beatriz Pinheiro, residente em medicina de família e comunidade no Centro de Saúde Maria Augusta Estrella. — Foto: Fernanda Andrade.
Por isso, o diálogo e a escuta podem ser terapêuticos — e são essenciais na ESF. Foi isso que levou a jovem médica formada pela Uerj, nascida e criada em Vila Isabel, a escolher medicina de família e comunidade. “Olhar para essas pessoas e mostrar que as vejo é o que dá sentido para minha profissão”, pontua.
Na subida da Rua Petrocochino, que dá acesso ao morro e nome à sua equipe no Maria Augusta Estrella, ela encontra um paciente ou outro e faz uma pausa para conversar. A saúde da família também acontece na rua, ao acaso, guiada pela força dos encontros e das encruzilhadas. Ali, uma pessoa que faz tratamento para uma doença crônica e andava sumida; adiante, uma idosa a caminho do mercado que aproveita para contar como vai a dor no joelho; mais além, uma trancista que revela estar grávida do segundo filho.
“O que eu mais aprendi é que para poder fazer saúde, é preciso entender a pessoa como um todo, como um corpo e uma mente que vive em um território, que se relaciona com outras pessoas, que exerce atividades na vida, que vem de um contexto familiar, que tem crenças e padrões, às vezes até de adoecimento”, conta Beatriz. Pessoas são contextos, não apenas doenças, diz — e isso é algo difícil de compreender quando se restringe a medicina à ideia de “tratamento hospitalar”.
Para Beatriz, o que a fez se encantar pela MFC foi o conceito de longitudinalidade. “É a continuidade do cuidado, poder acompanhar a pessoa em diferentes momentos da vida. O nosso cuidado nunca para”, explica. Desde a faculdade, o contato com a saúde da família possibilitou exercitar esse outro olhar. “Eu conheci a Dona Maria: num dia eu via a Dona Maria por conta da pressão; no outro, por um resfriado; no outro, por conta de uma dor. E comecei a perceber que podia conhecer o filho da Dona Maria, a neta da Dona Maria, a casa da dona Maria”, exemplifica.
Naquela sexta-feira nublada, porém, não era dia de rua. Ela chegou por volta de 7h para atender no consultório durante toda a manhã. Uma média de 15 consultas por dia. A primeira paciente é uma antiga conhecida: uma idosa que costuma vir às sextas-feiras para conversar e estava ansiosa para a médica voltar de férias para contar sobre a dor no joelho. “Ela sempre me diz: ‘Você sabe toda a minha história’. Ela gosta de vir comigo porque sabe que eu a conheço. Ela não precisa falar desde o início como a dor apareceu, ou de como é a relação com o marido, e porque ela se sente tão estressada. A cada consulta, a gente parte do ponto em que parou”, discorre a médica.
Beatriz comenta que as pessoas chegam à saúde da família querendo resolver todos os problemas — porém, é preciso explicar que nem tudo será solucionado em uma única consulta. “O tempo vai permitindo que a gente conheça a pessoa, entenda a sua forma de ter saúde e adoecer e quais são as ferramentas individuais, familiares e da comunidade que ela dispõe”, diz.
Para isso, é essencial o chamado diagnóstico comunitário. Para Brenda Costa, co-coordenadora e preceptora da Residência em MFC da Uerj e diretora de comunicação da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), esse é um dos princípios da ESF: entender como os contextos de cada comunidade influenciam os processos de saúde e doença. “Durante dois anos de formação na residência, a gente faz o desenvolvimento dessas habilidades em abordagem comunitária. A primeira delas é o diagnóstico comunitário: entender qual é o perfil epidemiológico e social de cada área”, explica [Leia a entrevista clicando aqui].
Na área da equipe Petrocochino, por exemplo, que abrange quase metade do Morro dos Macacos, a violência armada é uma condição que adoece e afeta a vida das pessoas. “É um fator de estresse constante. Provoca picos hipertensivos, descontrole do diabetes”, conta Beatriz.
A geografia da comunidade também interfere no cotidiano da saúde: Macacos é uma favela de morro, com trechos íngremes, de difícil acesso. “Como é um território de escada, tem muitas pessoas com questões osteoarticulares, como artroses, muitas dores musculares”, relata. A comunidade conta ainda com muitos trabalhadores braçais e autônomos. “Geralmente são pessoas que trabalharam muito com o corpo durante a vida, com serviços manuais, que geram um desgaste físico, como homens que trabalham em construção, muitas mulheres que atuam com serviços gerais ou faxina”, resume a médica.
Olhar a realidade, seja do alto do cruzeiro, das ruas ou das casas, conversando com as pessoas, ajuda a entender as necessidades em saúde. “A gente tem que fazer a leitura de quais são os principais motivos de adoecimento da população para direcionar as estratégias, porque a gente não tem como dizer que todas as populações adoecem da mesma forma”, reflete Beatriz.
Caminhar pelo território, observar, conversar com as pessoas e realizar as visitas domiciliares fazem parte da rotina da Estratégia Saúde da Família. — Foto: Fernanda Andrade.
3. A realidade
Na mesma rua de Dona Nadir, a equipe Via Láctea segue para a casa de outra idosa. No caminho, eles nos informam que é um estado de saúde bem mais delicado e que a paciente prefere não ser identificada nem fotografada. Apenas observamos em silêncio, com a concordância da família.
Dona T. mora em uma casa de vila. Muito magra, recebe a equipe com a filha, na sala, que relata que a mãe tem enfisema pulmonar e, há dois meses, apresentou um quadro de AVC. Foram até a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA), mas retornaram sem conseguir fazer os exames. O médico Marcos se mostra preocupado e quer saber como a idosa tem passado. “De um ano pra cá, ela veio emagrecendo muito”, a filha recorda. “Tenho tido muito esquecimento”, diz Dona T.
Na parede, um quadro com os dizeres: “Pendure a alma no varal e deixe que as coisas ruins evaporem”. Em uma casa próxima, um cachorro late durante toda a consulta. Um gatinho entra em cena. Marcos faz carinho no animal e diz que adora gatos. A abordagem vai deixando a consulta mais leve. O médico combina com a filha de Dona T. para que ela compareça à tarde, no centro de saúde, para conversarem melhor, sem a presença da idosa, e poderem esclarecer o caso. Uma ferida na perna também o preocupa, e ele diz que fará uma avaliação compartilhada com colegas e preceptores da residência.
Cada residente realiza visitas domiciliares uma vez por semana, nas casas que foram monitoradas nos dias anteriores pelos ACS. “Os agentes comunitários estão sempre próximos ao paciente. Fazem visitas rotineiras, passam pelo território e colhem demandas e necessidades”, descreve Marcos. Por morarem no território, eles geralmente conhecem os pacientes há muitos anos. “O ACS ajuda a puxar algumas coisas que não estão descritas no prontuário, pois ele conhece do cotidiano” [Leia matéria sobre o papel do ACS também nesta edição].
No cotidiano, Marcos percebe reflexos decorrentes da pandemia. “Muita gente perdeu espaços de troca e coisas que faziam antes da covid. Isso impacta na saúde mental das pessoas”, reflete. A solidão, o abandono e o sofrimento são notados pelo caminho. “Por conta dos impactos sociais da pandemia e do contexto político, muita gente perdeu plano de saúde ou emprego, as coisas foram encarecendo, e as pessoas deixaram de acessar alguns serviços, como atividade física, pilates e fisioterapia”, descreve.
Por volta de 11h30, a equipe Via Láctea retorna ao centro de saúde com as visitas concluídas. O dia ainda não acabou. À tarde, Marcos receberá a visita da filha da dona T. para tentar ajudá-la de alguma forma.
“Todo mundo merece um médico de família pra chamar de seu”, diz o residente em medicina de família e comunidade, Antonio Branco Jr. — Foto: Fernanda Andrade.
4. A escuta
“Para tudo na vida, a gente precisa ouvir”. Assim afirma Antonio Branco Jr., médico no terceiro ano de Residência em MFC, também pela Uerj. Mineiro de Lagoa da Prata, no centro-oeste do estado, ele já andou um bocado de estrada por conta da medicina: cursou a faculdade em Viçosa, na Zona da Mata, e fez dois anos de residência na histórica Ouro Preto, na região central de MG, até se mudar para o Rio em busca do terceiro ano, que é opcional, voltado para gestão em saúde e formação de preceptores.
“Não adianta ter o melhor conhecimento médico se não souber acolher as pessoas”, constata. Segundo o residente de 27 anos, é preciso se “despir” da posição de autoridade do médico como o único detentor da verdade: “A gente não é mais importante que o paciente. O médico é só o condutor do cuidado. Inclusive é preciso ter a sinceridade de falar: “Eu não sei o que você tem, mas a gente está aqui para descobrir junto”, pontua.
O que levou o jovem estudante a escolher o caminho da MFC, desde a graduação, em contato com os professores que atuavam no SUS, foram as histórias das pessoas. “Uma coisa que me chamava a atenção era a conversa, poder ouvir uma história, algo que não encontrava tanto nos ambulatórios de outras especialidades, muito centrados na doença”, relembra.
Antonio também reforça que o paciente não pode ser visto de forma isolada. “Ele é o lugar onde mora, as pessoas com quem convive, o trabalho, o lazer”, afirma. Porém, o maior desafio, segundo o residente, é entender que em muitas dessas questões não se consegue intervir em nível individual. “Isso é algo que traz muita angústia, principalmente nos casos que a gente vê sofrimento mental associado ou que estão relacionados a alguma questão social em que não temos poder de ação individual”.
Antonio atua na equipe Conselheiro, que abrange outra parte do Morro dos Macacos, ao lado da área coberta por Beatriz, a Petrocochino. Ele faz questão de lembrar que não existe saúde da família sem trabalho multidisciplinar. “Promover saúde e prevenir doenças não é uma tarefa somente do médico. A gente previne, promove e trata condições de saúde com os enfermeiros, os nutricionistas, os educadores físicos, com os ACS — que são fundamentais para trazer essas informações que a gente não tem dentro do consultório”, destaca.
O médico apaixonado por histórias diz, no entanto, que muitas vezes, por conta das pressões cotidianas, há um risco dessa escuta ficar para trás. “Existe muita cobrança das metas, por atendimento individual, médico centrado. E isso acaba deixando de lado outras ferramentas muito importantes para o médico de família”, avalia. Ainda assim, ele aposta: “Todo mundo merece um médico de família pra chamar de seu.”
A expe
Os grupos em saúde são uma experiência de educação popular em saúde muito utilizada na atenção primária. Na foto, Beatriz conduz o grupo sobre autocuidado. Foto: Fernanda Andrade.
5. A partilha
Em roda, as pessoas aguardam o início da atividade. Há um clima de expectativa no ar. “O que vocês entendem por autocuidado?”, pergunta Beatriz. Alguns se olham, curiosos. Outros não sabem o que responder. Aos poucos, vão surgindo algumas palavras, que ela escreve em um quadro para não esquecerem: conversar; dançar; respeito consigo mesmo; alimentação saudável; lazer; atividade física; vaidade; espiritualidade; vida social.
Talvez alguns daqueles homens e mulheres reunidos ali, a maioria idosos, nunca tenham parado para pensar sobre essa questão. “A gente está sempre correndo muito, ou com a cabeça lá atrás. Dificilmente paramos para focar no presente”, comenta Beatriz, para estimular o debate.
Eles são convidados a fechar os olhos e a fazer um exercício de meditação. A prática é parte das atividades do grupo de saúde que a médica promove todas as sextas-feiras à tarde, no Maria Augusta Estrella. Cada residente deve escolher um tema para trabalhar com os grupos de educação em saúde, reforçando a ideia de que a saúde da família acontece no coletivo, pela partilha de vivências.
Ao final da atividade, a médica convida os participantes a plantarem uma semente, num gesto simbólico de assumir a responsabilidade com o autocuidado. Esse ato fala muito também sobre o principal aprendizado que Beatriz afirma ter recebido da MFC. “Aprendi a enxergar que a pessoa tem autonomia sobre a sua saúde. Ela mesma é quem é mais capacitada para dizer porque ela adoece e porque tem saúde”, afirma.
Na faculdade, o que se aprende é que tudo se resolve com uma prescrição, relata. No entanto, isso é um engano. “Sem entender todo o meio em que a pessoa está inserida, a comunidade, o território, a família, o trabalho, nós nunca vamos compreender o que ela está querendo nos dizer”, ressalta. “Às vezes a pessoa só vai querer falar. Ela só quer se sentir ouvida, só quer que você a escute”.
O médico ou a médica de família e comunidade deve romper com a ideia de que sabe tudo ou de que tem todas as respostas. “É preciso sair da postura de que a gente tem algo a ensinar para as pessoas e entender que mais aprendemos com elas. A própria pessoa ensina a gente a cuidar dela”, afirma a residente.
Nos encontros e desencontros, nas ruas e nas casas, no consultório ou nos espaços públicos, a verdade é que não se faz saúde sozinho. “É preciso ter vontade de escutar, de caminhar ao lado”, completa Beatriz. Para quem vive a saúde da família e comunidade todos os dias, esse é um conselho sábio das ruas.
Partipantes do grupo sobre autocuidado que Radis acompanhou. Foto: Fernanda Andrade.
Lirismo da medicina no SUS
“Trabalhar na ESF é vivenciar, diariamente, a poesia de Guimarães Rosa: coragem para exercer o esquenta e esfria da vida. É nessa gangorra de disparidades e na vastidão de paisagens que compõem esta nação que a vida surge e se desvanece.
Em três anos, vi e atuei em equipes articuladas que podem gerar elevados níveis de coberturas vacinais e seguimento pré-natal ‘melhor que particular (na fala de pacientes)’. O acompanhamento de novas famílias em sua evolução na literacia em saúde a partir da garantia de pré-natal do parceiro, elaboração de planos de parto e cuidados materno-infantis, por exemplo. A integração ensino-serviço que propicia a fisioterapia em domicílio e atenção personalizada à pessoa idosa.
É na ESF que se potencializa o comprometimento de transferir o conhecimento em saúde, mediante divulgação científica, fortalecendo e dignificando famílias e comunidades.”
[Depoimento de Ana Izabel Nascimento Souza (foto abaixo), residente em MFC pela Universidade Federal de Sergipe (UFS) na cidade de Lagarto, no centro-sul do estado, enviado à Radis]
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